Ontem, na abertura do Colóquio Arte & Transcendência, na Escola Dominicana de Teologia, o Prof. Dr. Alfredo Bosi lembrou-nos que transcender difere de ascender, sobretudo porque enquanto esse segundo verbo implica também em movimento, nele, no entanto, se enfatiza o ponto de chegada e que está fora do eu, ascender: subir-se, elevar-se, atingir. Já a transcendência implica em um movimento que tem necessariamente o próprio ponto de partida como referência. O eu transcende. Portanto, parte-se da imanência para a transcendência.
São Francisco de Assis, o santo poeta, inaugurou, por assim dizer, a poesia em língua italiana com o seu Cantico delle Creature (Cântico das Criaturas), em 1224. O professor alertou-nos para o fato de que além do ideário medieval e bíblico, presente na introdução do seu poema, ele inova quando utiliza a partícula per do italiano arcaico. Laudato si', mi' Signore, per sora luna e le stelle e, como é possível perceber, com destacada ambiguidade (uma possível dupla conotação para o emprego da partícula é, aliás, objeto de estudos de eruditos e ponto de controvérsias). Assim, devemos louvar a Deus pelas criaturas (por suas criaturas, o sol, a lua, as estrelas, o vento, etc) como também Deus deve ser louvado pelas próprias criaturas (por cada uma dessas criaturas). O que me pareceu de particular significação é que, nesse contexto, ele também nos propõe louvar a Deus pela irmã morte Laudato si', mi' Signore, per sora nostra morte corporale. Não me surpreendeu tal inclusão da personificação da morte no contexto dos motivos pelos quais devemos louvar ao criador. Mas é fato que, no nosso cotidiano, as pessoas só rezem para pedir, quase não louvam, ou não veem motivos para louvar e o que é mais sintomático: peçam, primeiro, para não morrer. Ao menos não ainda ou tão cedo. Só alcançando a transcendência necessária, e que a arte nos possibilitaria, para fazer também nossas e com um átimo de verdade as palavras do santo em sua poesia transcendental.
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