terça-feira, 25 de junho de 2013

cordas dedilhadas antigas


Eu tenho um amigo muito querido que sempre me avisa de programas alternativos maravilhosos na cidade de São Paulo. Hoje, ele enviou-me uma mensagem by celular, dizendo que teríamos um concerto de cordas na Igreja Santo Antônio, que fica na praça do Patriarca e que seria na hora do almoço.

Como trabalho muito perto dali, fui na minha hora de almoço conferir o que estava acontecendo.

Foi um prazer imenso participar deste evento, como público. É que tive uma aula sobre a evolução dos instrumentos de cordas no ocidente. O músico Guilherme de Camargo, doutorando e mestre em Musicologia e bacharel em Música pela ECA-USP, contou-nos um pouco de cada instrumento que ele levou ao concerto e nos demonstrou seu perfeito funcionamento, tocando-os todos.

Ele tocou um alaúde renascentista; uma teorba, instrumento do século XVII, XVIII; uma guitarra barroca; uma viola de Arame (séc. XVIII) e, por fim, uma guitarra romântica, instrumento característico do século XIX.

O repertório percorreu os compositores das épocas a que pertencia cada instrumento, desde o século XVI até o início do XX, pois também ouvimos, por fim, tocada na guitarra romântica, uma composição do brasileiro Aníbal Augusto Sardinha, o "Garoto", talentoso e arrojado compositor e que viveu entre nós de 1915 a 1955.

Antes, ouvimos John Dowland (1563-1626), Thomas Robinson (1560-1610), Robert de Visée (1655-1710), canções do século XVIII do Codex Lisboa, e também de Fernando Sor (1778-1839). Guilherme de Camargo falava com muita naturalidade dessas obras, dos instrumentos de cada época e tocava-os todos com tanta dedicação! Mas também não podia ser diferente: o rapaz morou por dois anos na Holanda apenas para especializar-se nas cordas dedilhadas antigas.

Quem ficou com vontade de ter participado desse evento sui generis pode ter a oportunidade de vivenciar algo parecido. É que depois dessa primeira apresentação do projeto Sons das Igrejas do Centro - Especial Cordas Dedilhadas, realizado pelo Sesc Carmo, e que foi pensada para apresentar todos os instrumentos, nós teremos a oportunidade de ter cada um dos mesmos instrumentos em apresentações individuais. Na programação, o próximo concerto será no dia 16/07, às 13 h, na Paróquia São Francisco de Assis. Nele, teremos Alexandre Ribeiro, instrumentista, bacharel em violão, especialista em cordas dedilhadas antigas, tocando a teorba , instrumento que gozou de grande prestígio até o fim do século XVIII, mas que só voltaria à cena a partir de 1960 e que, apesar de ser muito utilizado na Europa e nos EUA, no Brasil é sempre uma oportunidade raríssima ouvi-lo.

E é linda a sonoridade da teorba!

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Declaração de Amor em 12 de junho

Estou lendo um romance de Henry James: Lady Barberina. Minto. Esse é o segundo livro do mesmo autor que leio na mesma semana. Terminei, anteontem, de ler A Outra volta do Parafuso ou apenas A Volta do Parafuso [The Turn of Screw]. Falarei aqui dessa obra, depois que eu assistir à ópera de Benjamin Britten, The Turn of Screw, no próximo dia 22, no Theatro São Pedro, evento que me motivou a reler esse romance de James.
Mas, como hoje é dia dos namorados, eu quero apenas registrar esta linda passagem do romance Lady Barberina. A cena se passa durante uma recepção em uma mansão inglesa entre o final do XIX e início do XX, quando acontece um diálogo em que um jovem americano se declara a uma moça inglesa.

Dedico esta passagem aos que são sensíveis a declarações de amor sinceras.


Vamos combinar que a expressão do amor que envolve duas pessoas é mesmo uma coisa muito boa de se sentir e de se viver, mesmo que sua lembrança só possa por ora nos vir assim, por meio de personagens fictícias.

                De qualquer maneira, eu sou uma pessoa que acredito demais no amor!

– Não creio que eu devesse permanecer aqui – observou Lady Barberina, olhando em volta.
– Não se retire até eu lhe dizer que a amo – murmurou o jovem.
                A moça não soltou exclamação alguma, nem sequer estremeceu; ele nem mesmo pôde perceber qualquer alteração em sua fisionomia. Lady Barberina acolheu essa confissão com nobre simplicidade, a cabeça ereta e os olhos baixos.
– Não creio que tenha o direito de dizer-me isso.
– Por que não? – perguntou Jackson Lemon. – Desejo ter esse direito. Desejo que você mo dê.
– Não posso... Não o conheço. Você mesmo disse.
– Não pode confiar um pouco? Isso ajudará a nos conhecermos melhor. É horrível essa falta de oportunidade; mesmo em Pasterns quase não podia passear com você. Mas tenho a maior confiança em você. Sei que a amo e que não poderei deixar de amá-la depois desses seis meses. Amo sua beleza, amo-a da cabeça aos pés. Não se mova; por favor, não se mova.
                Ele baixara o tom da voz; tudo ia diretamente ao ouvido dela, e é de crer que havia naquele tom certa eloquência. Quanto a ele, depois de ouvir a si próprio pronunciar aquelas palavras, sentiu uma vibração que lhe percorria o ser. Era um prazer falar-lhe da própria beleza; isso o levava para mais perto dela, como nunca estivera. Mas o rosto dela se ruborizara, e isso pareceu lembrar-lhe que a beleza não era tudo.
– Tudo em você é doce e nobre – continuou . – Tudo em você me é precioso. Sei que você é bondosa. Não sei o que pensa de mim. Pedi a Lady Beauchemin que me dissesse, e ela mandou que eu mesmo julgasse. Pois bem, julgo você igual a mim. Não terei o direito de admitir isso até que se prove o contrário? Posso falar com seu pai? É o que desejo saber. Venho esperando isso; mas, agora, por que deveria esperar mais tempo? Desejo poder dizer-lhe que você me deu alguma esperança. Suponho que você deva falar com ele primeiro. Queria falar amanhã; mas, hoje à noite, pensei em conversar antes com você. Em meu país, isso não importaria muito. Lá, você própria teria de considerar tudo. Se me disser que não fale com seu pai, não falarei. Esperarei. Mas prefiro pedir-lhe licença para falar com ele dói que pedir a ele licença para falar com você.
  
              Sua voz passara a sair quase num murmúrio, e, embora tremesse, a emoção dava-lhe uma intensidade peculiar; mantinha entretanto a mesma atitude, os polegares nos bolsos das calças, a cabeça levantada e o sorriso que lhe transparecia muito natural nos lábios; ninguém teria imaginado o que estava dizendo. Ela escutara-o sem se mover, e, quando ele terminou, ergueu os olhos. Pousou-os nos dele um momento. Ele lembrou-se, muito tempo depois, da expressão que passara aquele olhar.
– Pode dizer tudo o que queira a meu pai, mas não quero ouvir mais coisa alguma. Você falou muito, considerando-se o muito pouco que me deu a entender, antes.
– É que estive observando-a – confessou Jackson Lemon.
                Lady Barberina ergueu mais ainda a cabeça e fitou-o nos olhos. Disse, depois, com seriedade:
– Não gosto de ser observada.
– Não devia, então, ser tão bonita. Não vai me dar uma palavra de esperança? – acrescentou ele.

(JAMES, Henry. Lady Barberina; A outra volta do parafuso. Traduções de Leônidas Gontijo de Carvalho e Brenno Silveira. São Paulo: Abril Cultural, 1983)

quinta-feira, 6 de junho de 2013

O Adagio Maestoso – Alegro com Brio, de Franz Schubert

Franz Schubert, jovem.

Hoje, Ligiana Costa, no programa Manhã Cultura da Rádio Cultura FM, anunciou a “próxima música”, dizendo que íamos ouvir o primeiro movimento da Sinfonia nº 3 em ré maior, o Adagio Maestoso – Alegro com Brio, de Franz Schubert, compositor que viveu apenas até os 31 anos de idade e que não teve seu talento reconhecido em vida.

Então, começou a tocar a música.

Qualquer um que já tenha ouvido esse movimento da referida sinfonia de Franz Schubert fica impressionado com a beleza da alegria genuína que ali é evocada. No entanto, como eu soubera que tais sensibilidade e brilho artísticos não tinham sido reconhecidos, eu fique com o coração na mão! E, quando isso acontece, eu sempre vou às lágrimas!

Enquanto ouvia, hoje especialmente, comecei a desejar que Schubert pudesse saber do meu sentimento de gratidão. Que ele conhecesse meu reconhecimento por essa riqueza do seu talento, por ele ter sido alguém capaz de criar tanta harmonia e com tanto fulgor criativo.

Sim, fiquei com desejo de ser aquele que redimisse a falha de seus contemporâneos. 
Como não puderam reconhecer tal talento?

Franz Schubert - ein unvollendetes Leben
[Franz Schubert - uma vida inacabada],
de Walter Kolm - 1953
A verdade é que há espíritos que não vêm a esse mundo na época em que seriam compreendidos: constituem a verdadeira avant-garde. E, sim, há muita beleza nessa entrega absoluta à criação mesmo que conheçam como resultado uma derrocada. Aliás, imagino que deva ser lindo, depois, saber do reconhecimento do público futuro. 

Mesmo que sendo esse meu reconhecimento e que foi conduzido do modo como o foi: no anonimato de lágrimas vertidas, enquanto ouvia sua música pelos fones de ouvido ligados a um aparelho de celular, sintonizado em uma rádio e, isso, enquanto caminhava por uma estação de trem, em um terminal urbano de passageiros da grande metrópole, situada no hemisfério sul deste, ainda que querido, também obscuro planeta terra. 

Na biografia do músico, fala-se muito de sua origem paupérrima, da profunda depressão que o acometeu em diversas passagens na vida, do sofrimento oriundo de uma doença incurável para a época, enfim, em muito sofrimento.

Tanta adversidade é ainda um motivo maior para que admiremos sua genialidade, não é mesmo? Por tudo isso nutrimos este sentimento de gratidão, posto que nada disso impediu que ainda hoje possamos ouvir todo seu legado de beleza e triunfo!

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Entrevista com um otimista

- Em que você anda pensando?

- Como não sou filósofo, não estou construindo nenhum pensamento propriamente, ou seja, no sentido filosófico da palavra. Mas penso, comumente. Apenas tenho me esforçado para pensar com cuidado. Ou seja, procuro não por em palavras nada que seja expressão de um sentimento corrosivo ou deprimente.

- E você consegue fazer isso o tempo todo?

- Por vezes, naufrago no hábito de pensar mal ou pela força do hábito. E acho que somos todos viciados em pensar assim. Mas, quando me vejo enveredando por esse caminho, imediatamente, procuro me lembrar da promessa que fiz a mim mesmo e que foi a de ser uma pessoa melhor de um modo geral.

- Então, esse compromisso do pensamento por meio de palavras “vivificantes”, se podemos chamar assim, em oposição àquelas que expressariam algo deprimente ou mortificante, tem também algo a ver com as outras pessoas?

- Na verdade, tem tudo a ver com os outros, mas sobretudo com esse outro que eu próprio costumava ser e que, às vezes mais às vezes menos, era a expressão de alguém corrosivo, deprimente, maledicente, enfim, isso tudo que torna a vida um sofrimento insuportável. Enfim, trata-se de uma tentativa muito sincera de aprender a amar.

- Por isso é que você tem exercitado pensar e falar assim de um jeito diferente?

- Sim, é um modo diferente porque incomum e, claro, é ainda um jeito de expressar o pensamento que é absolutamente novo para mim. Mas eu sei que as pessoas vão me ver daqui em diante e possivelmente desejarão dizer: como ele está diferente! Eu confio que isso irá acontecer, inexoravelmente, e cada vez com mais frequência, se Deus quiser e graças a Deus!

- Você poderia nos dar um exemplo do que constitui na prática esse modo de pensar?

imagem via Wiki
- Por exemplo, evitar ao máximo falar mal das pessoas, simplesmente porque isso não é vital e tampouco vitalizante.
Querer e verbalizar isto: eu mereço o melhor, aquilo que Deus tem reservado para mim, desde sempre.
Desejar o bem para qualquer um. Não se queixar de nada, absolutamente.
Agradecer a Deus por tudo, até pelo que inicialmente possa parecer que não é algo bom (no final das contas sempre é, apenas preciso ter paciência para alcançar o desfecho da tal situação de conflito).
Ser generoso consigo e com o maior número possível de pessoas.
Em todas as ocasiões, pensar verdadeiramente: o entusiasmo divino me anima e cumpro com gratidão minha vida de alegria e triunfo.