segunda-feira, 28 de junho de 2010

Clarice Lispector Só para mulheres. Eu li.

Sexta-feira passada, eu estava visitando um grande amigo. Como é bom ter amigos, como é bom conversar e rir com alguém que compartilha dos mesmos gostos e aprecia o que também apreciamos. Ele me mostrou um livro que ganhou de presente de aniversário. Trata-se de Clarice Lispector - Só para mulheres. A publicação dá prosseguimento ao resgate da obra jornalística de Clarice Lispector, iniciado em 2006, com o livro Correio feminino. Essa nova coletânea – organizada por Aparecida Maria Nunes, doutora em literatura brasileira pela USP – recupera as colunas femininas assinadas pela escritora sob os pseudônimos de Tereza Quadros e Helen Palmer, e como ghost-writer da atriz Ilka Soares, para o tablóide Comício e os jornais Correio da Manhã e Diário da Noite, nas décadas de 50 e 60.
Fica evidente que a Clarice escreveu para esses suplementos femininos porque precisava de grana. Mas também fica evidente o seu amor e respeito pelas leitoras. Essas leitoras não seriam as mesmas leitoras e leitores de seus romances, pelo menos não a maioria. As exigências de pauta conduziram os temas dos textos muito curtos. Mas quão grandiosa é Clarice que, mesmo falando de maquilagem, de culinária, do que seja... é ela mesma o tempo todo. Eu e meu amigo nos divertimos a valer. Ríamos, ríamos e ríamos no começo, no meio e no fim de cada trecho do livro. Era o riso franco de quem se encontrou entre os iguais e que compreende a sabedoria disfarçada em simplicidade absoluta. Que, diga-se de passagem, talvez seja essa a verdadeira sabedoria: saber dizer a qualquer um o que é importante que seja dito.
O meu amigo só tinha esse primeiro volume, mas já ouvi falar que são três.
Não resisto e trago alguns trechos para cá. Vejam se não é uma leitura deliciosamente agradável:

Pode-se amar sem admirar?
Pode-se dar amor natural, comum. Pode-se ter pena da pessoa ou ser fisicamente atraída por ela, e enganar-se pensando que essa reação é amor. Mas para que o amor real exista é preciso que você admire alguma coisa nele ou nela. Theodore Reik acha que o "amor só é possível quando você atribui um valor mais alto à pessoa do que a você, quando você vê nela ou nele uma personalidade que, pelo menos em algum sentido, é superior à sua."

Quem muito agrada, desagrada.
Nunca ouvi esse provérbio, acho que inventei agora mesmo. Mas você vai ver se esse provérbio, inventado ou não, não se aplica a pessoa que você conhece: Às que querem agradar a todo o preço. Então tornam-se "encantadoras". Procuram advinhar os mínimos desejos dos outros. Procuram elogiar de qualquer modo. Começam também a mostrar que fazem sacrifícios a cada momento. Esse tipo encantador pesa na alma dos outros. Em uma palavra: desagrada. Se a pessoa consegue ser e ficar à vontade, ela deixa os outros serem e ficarem à vontade.

Já se foi o tempo...
...Em que era considerado delicado deixar sempre um pouco de comida no prato. Hoje é perfeitamente educado comer toda a porção de que a pessoa se serviu.
...em que se pegava numa xícara de chá ou de café... erguendo o dedo mínimo. Hoje é gesto afetado, deselegante, de mau gosto.
...em que era de praxe recusar várias vezes uma gentileza antes de aceitá-la. Quando o convidarem para um jantar, agradeça, aceite, e não faça um drama "do trabalho que vai dar"... em que, ao sentar à mesa, dizia-se aos outros: "bom apetite!" Não é mais "fino" dizê-lo.
...em que a pessoa que tocava piano se achava no dever de recusar uma pequena audição, várias vezes, antes de aceitar. Se você, não quer realmente tocar, diga-o de um modo suave mas firme, o que em geral encerra o assunto. Mas se pretende terminar tocando, toque, por favor!

Impossível?
A maioria das coisas "impossíveis" são impossíveis apenas porque não foram tentadas. Quanta coisa você não faz apenas por timidez ou por medo...
Você já experimentou pintar paredes? Pois, acredite ou não, não é necessário tirar "curso" (só um pouco de "confiança-em-si-mesma" ajudaria, pois confiança é o que lhe falta).
A tinta, você compra. O pincel, também. A parede, você tem. Por incrível que pareça, você é dona dos instrumentos necessários. O que falta mais? Um pouco de ousadia e vontade de se divertir. (E de economizar).

Não lhes disse que era o máximo? São postagens de um blog de Clarice de 60, 50 anos atrás. ;-D

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