terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Ler: a felicidade que está tão perto de nós

  Em um dos diálogos do livro Sobre a Filosofia e outros diálogos, de Borges e Osvaldo Ferrari, do qual já falei aqui, Ferrari, em um capítulo a que se chamou Sobre os diálogos, comenta com Borges que quando esses diálogos, que ambos vinham tendo no rádio, propagaram-se em um jornal e depois tomaram a forma de um livro, isso foi particularmente interessante porque ajudou a que tais diálogos fossem compreendidos, e, então, ele continua:


[Ferrari] (...) essa compreensão aconteceu entre aqueles que frequentam habitualmente a literatura, e entre aqueles que não estão familiarizados com ela.
[Borges] Entre aqueles que se abstêm asceticamente da literatura, masoquistas que se castigam não se sabe porque motivo (ambos riem), se abstendo dessa felicidade que está tão perto de todos. No entanto, as pessoas renunciam a ela; é como se... não sei, como se negassem à água, à respiração, ao sabor das frutas... ao amor, à amizade. Bem, renunciar à leitura equivale a isso, um ascetismo que é praticado de maneira inconsciente, já que ninguém o justifica; ninguém diz, vamos ser dignos de mérito, vamos deixar de ler, assim seremos premiados em outro mundo. Não, se pratica dessa forma, com espontaneidade, com espontânea inocência.
Sim, mais ainda. Se continuarmos assim, acontecerá algo que eu vi na casa de um senhor alemão faz muitos anos. Ele tinha não me lembro que obra - era um atlas em muitos volumes, ou um dicionário - e eu quis consultar um dos volumes, e aconteceu que só eram lombadas de livros, não tinha nada atrás dessas lombadas (ri).
[Ferrari] Um simulacro de biblioteca.
[Borges] Sim, um simulacro de biblioteca, algo típico de certos ambientes.

Fico imaginando a decepção de Borges quando descobriu esse simulacro. Afinal, quem ama ler quer ler e quanto mais lê mais ama os livros e a leitura e tem horror a essa tolice de livros que só parecem livros! ;-p
Por falar em lombadas de livros. Fui procurar os tais simulacros de biblioteca de que fala Borges para ilustrar esse post e encontrei essas imagens sensacionais do mesmo simulacro, mas de outra natureza ou finalidade.






No blog cabo-verdiano Con(ou sem)tigo, MM nos conta que uma biblioteca na cidade do Kansas, para promover a leitura e a biblioteca, cobriu o exterior do seu estacionamento com essas lombadas gigantes, o mais interessante é que a escolha dos livros foi indicada pelos próprios moradores, provavelmente frequentadores da biblioteca. Não é uma ótima ideia?

2 comentários:

  1. O segundo tipo de simulacro é, sem dúvida, muito mais interessante. Boa sacada, bitcho.

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  2. Pois é Felipe, são essas coincidências que só a experiência de navegar na WEB proporciona, e que eu acho que são as mais salutares, não é mesmo?

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