segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Sobre a brevidade da vida

Quem frequentou esse blog no período das festas de fim de ano notou minha ausência, é que precisei dedicar-me ao ócio: um ócio construtivo, diga-se de passagem, em contato com a família, com os livros, dvds, músicas e amigos.
Hoje, primeiro dia de trabalho do novo ano, senti-me estranho. Trabalhei direitinho, of course. Mas havia no ar uma nota de estranhamento e que todos, bem ou mal, comungavam. Difícil até de explicar. Porém, um acontecimento feliz ocorreu, quando um colega de trabalho disse-me: Josafá, vale a pena ler os pockets da L&PM. E eu disse: Sim, eu já li vários. Ele, então, partilhou comigo a notícia do prazer que sentiu lendo, dessa coleção, a tradução de um tratado de Sêneca: Sobre a brevidade da vida. Ao sair do trabalho, passei em uma banca de jornais e comprei o livrinho.
O li enquanto voltava do trabalho, na viagem de trem, da qual, aliás, acabo de chegar.
E que primor de leitura!
Logo na capa há uma citação de Denis Diderot que dele dizia: "Este tratado é lindo: recomendo sua leitura a todos os homens." Achei isso tão peculiar. Por que Diderot podia dizer isso sobre uma obra clássica, e nós, muitas vezes, ficamos com pecha em dizer que determinado livro é lindo e que recomendamos a todos, assim simplesmente?
Diderot tem toda razão. O obra é daquelas que, após lermos, temos mesmo o desejo de que todos saibam o que vai naquelas linhas, por que são lições necessárias, e com palavras tão equilibradas, que é impossível um ser humano, alguém que assim possa ser chamado, não compreender a intensidade e profundidade do que encerram.
Algumas passagens são lapidares:

(...) A vida se divide em três períodos: aquilo que foi, o que é e o que será. O que fazemos é breve, o que faremos, dúbio, o que fizemos, certo. Na verdade, o destino perdeu o controle sobre o passado, ninguém pode querer recuperá-lo (...)
(...) Ninguém retoma de bom grado o que passou, exceto aquele cujas ações estão submetidas à sua própria consciência. O que cobiçou ambiciosamente, enganou perfidamente, venceu violentamente,  furtou desonestamente e prodigamente gastou deve temer a sua própria recordação. Esta é a parte sagrada da nossa vida, que ultrapassa todos os reveses humanos, que não pertence ao destino e que não pode ser atingida pela miséria, pelo medo, nem pelo ataque das doenças. Não se pode incomodá-la, nem tirá-la de quem a possui: a sua posse é perpétua e intrépida.. Cada dia só está presente por alguns momentos, mas todos os dias do passado a ti se apresentam quando assim ordenas; consentem que sejam detidos e inspecionados pelo teu juízo, algo que aos homens ocupados falta tempo para fazer.(...)
(...) 1. Dentre todos, somente são ociosos os que estão livres para a sabedoria, apenas estes vivem, pois não só controlam bem sua vida, como também lhe acrescentam a eternidade. Todos os anos que se passaram antes deles são somados aos seus. A não ser que sejamos muito ingratos, aqueles sábios fundadores das idéias consagradas nasceram para nós e nos prepararam para a vida. Pelos seus esforços, somos conduzidos das trevas para a luz, para as coisas mais belas. Não nos é proibido o acesso a nenhum século, somos recebidos em todos;. e se desejarmos, pela grandeza da alma, ultrapassar os pequenos limites da fraqueza humana, há um enorme espaço de tempo a ser percorrido. 2. Poderemos disputar com Sócrates, duvidar com Carnéades, encontrar a tranqüilidade com Epicuro, vencer a natureza do homem com os estóicos, ultrapassá-la com os cínicos. Uma vez que a natureza nos permite comungar com toda a eternidade, por que não nos afastarmos da estreita e pequena passagem do tempo e nos entregarmos com todo o nosso espírito ao que é ilimitado, eterno e dividido com os melhores? (...)
(...) 5. É lícito afirmar que se dedicam aos verdadeiros ofícios os que querem desfrutar, todos os dias, da intimidade de Zenão, Pitágoras, Demócrito, Aristóteles, Teofrasto e de outros mestres das boas artes. Nenhum deles faltará, nenhum mandará embora aquele que o procurar sem deixá-lo mais feliz e mais dedicado a ele; nenhum permitirá, a quem quer que seja, sair de mãos vazias, eles podem ser encontrados por qualquer mortal, seja durante o dia, seja à noite. (...)

E assim, aprendi, no primeiro dia útil do ano, o que sempre soubera: é melhor sempre estar em boa companhia e utilizar o tempo  dessa vida, tão breve!, sempre com o cuidado de conceber minha ação como um bem, a começar pelo bem que me permito fazer a mim mesmo. Portanto, não há motivos para desprezar a oportunidade de elevar o espírito: por exemplo, lendo Sêneca.

2 comentários:

  1. Oi Josafá!
    Gostei de sua sugestão, este livro deve ser ótimo! também sou chegada em um livrinho da L&PM. Estou fazendo a coleção de Balzac, mas já tenho outros autores. Vou procurar esse livro que vc citou.
    "Apressa-te a viver bem e pensa que cada dia é, por si só, uma vida". Sêneca
    Feliz 2011!

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  2. Valéria,
    Eu adoro os pockets da L&PM e eles são um verdadeiro hip no Brasil, eu considero que equivalem àqueles clássicos pockets books daquela charmosíssima editora britânica: a Penguim Books. Amo! Esse, em particular, você vai curtir muito, ainda mais que ele, sim, elabora o tratado exatamente na orientação da frase que você citou e que, penso, todo mundo deve concordar. Afinal, um dia inteiro bem vivido vale mais do que uma vida inteira sem aprendizado! ;-)

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