segunda-feira, 13 de julho de 2009

Ná Ozzetti e a transcendência

Além de autores, autoras, escritores de um modo geral, atores e atrizes, realizateurs, eu costumo ter saudades doidas ou doídas de cantores e cantoras que aprecio. Foi o que ocorreu hoje comigo. No mundo da musicalidade brasileira uma cantora pela qual eu tenho a maior estima, quero-lhe tão bem como se a conhecesse pessoalmente e ela fosse uma grande amiga minha, é Ná Ozzetti. É que quando ouvimos uma voz há muito tempo, essa voz mesma é querida.
Ná sempre cantou o que quis, do modo que quis cantar e sua carreira é absolutamente independente.
Seu despertar musical iniciou-se ainda na infância, ela diz que imitava as grandes cantoras de então (e de sempre): Elis e Bethânia.
Pensei nela esses dias porque embora ela tenha um ethos paulistano por excelência sempre percorreu o Brasil cantando. Quando vivi em Brasília, lembro-me de que Ná Ozetti sempre estava por lá, assim como o Itamar Assumpção. E era quando, então, eu podia matar as saudades do mundo de São Paulo, com esses meus queridos conterrâneos.
Hoje li uma longa entrevista que ela concedeu o ano passado para um site que é um primor, quando o assunto é música brasileira de valor incontestável.
Na entrevista, falou-se de tudo: ela estava entre amigos.
Ná está morando no meio do mato, num sítio em Jundiaí, bem pertinho de São Paulo.
Lá tem seus cachorros, os gatos da vizinhança, e seu jardim.
Lá compõe, elabora os projetos que dão continuidade à sua profícua carreira musical.
Um trecho que achei muito significativo e com o qual me identifiquei:

Tacioli - Ná, como você lida com o fim das coisas?
Ná - O fim? Depende do que, né? [risos] Tem coisas que dou graças a Deus que terminam, tem coisas que são muito dolorosas, depende do quê...
Tacioli - Fim da vida.
Ná - Não gosto nem de pensar nesse assunto. Mas é engraçado... A coisa que tinha mais medo de enfrentar na vida, já enfrentei. Agora tenho outros medos. Sempre achei que não ia suportar perder meu pai. E quando isso aconteceu foi de uma forma que entendi, de verdade, que era uma coisa natural. A gente sabe que é o fim, mas o difícil é você viver o momento. E vivi essa passagem de uma forma muito serena. É claro que dói, é muito difícil, mas foi de uma forma muito mais serena do que imaginava. Então acho que as coisas tem o seu momento e elas acabam mesmo, qualquer coisa, até um trabalho. Nunca tenho pena de terminar um trabalho. Quando tô sentindo que ele já deu, já sinto vontade de ir pra uma linha nova, de experimentar algo totalmente novo. Então, acho que lido assim.
Tacioli - E espiritualidade, tem isso?
Ná - Sou super espiritualizada. Não sou espírita, também não lido com religiões, nenhuma. Acho que fecha demais. Tanto que não sou praticante de religião nenhuma. De nascimento sou católica e sou religiosa. Rezo. Eu me sinto muito melhor nos dias que rezo. No dia que não rezo parece que algo faltou. Então, tenho muita necessidade dessa prática religiosa, mas de uma forma que, pra mim, é um mistério. Simplesmente rezo e não fico pensando o que vai acontecer comigo depois que morrer. Mas sei que a minha essência, de alguma forma, vai ficar. E dos que se vão, dos que partiram até hoje, não sei, algo continua.
Max - No mínimo em que fica.
Ná - Pois é, mas acho que cada ser é muito complexo, muito poderoso pra virar nada, pó. Isso pra mim, né? Acho que não justifica a vida.
Almeida - Mas qual é essa continuidade?
Ná - Isso pra mim é um mistério. Não sei e não tenho curiosidade de saber. Porque já li livro kardecista e não me identifiquei. Não tô falando mal de nada, estou falando de uma coisa pessoal, de identificação mesmo. Com qualquer religião. Já frequentei budismo, que é uma religião em voga no mundo. Tem algumas coisas do budismo que me identifico demais, mas algumas coisas sempre caem naquela coisa do dogma. Então prefiro não seguir religião nenhuma. Agora tenho me identificado muito com a ioga. Na ioga, a gente tem uma prática de meditação e os próprios asanas são... como fala, eles dizem essa concentração faz com que você, sei lá... Vocês querem ir por esse caminho? [risos]
Almeida - Sim.
Ná - Tem uma coisa que acho muito interessante e que meu professor de ioga fala porque a gente fica muito na mente... O que é a meditação? O que é a oração? É abandonar sua mente um pouco, sair dessa coisa racional e entrar numa outra frequência. É você permitir isso. Acho que a natureza vibra, são frequências, então acho que a oração é você se conectar com a natureza, com o cosmos, que é um mistério também. O que existe além da Terra? É muito grande isso tudo, sabe? Acredito em Deus, acredito nessa grandeza toda. Então sinto que a minha necessidade de oração é uma necessidade de conexão diária, como um alimento. É como se estivesse presa a um cordão umbilical com algo que rege tudo isso. E a oração é uma forma... Alguém criou essa oração, que é um mantra, que seja, que é uma forma de estabelecer essa conexão.(...)


Eu gosto de gente que fala acerca dessa temática, exatamente dessa maneira. ;-D

Para terminar:
A entrevista na íntegra pode ser lida no site http://www.gafieiras.org.br/

É imensa. Fica melhor, se você estiver ouvindo um dos discos da cantora, como eu fiz. No meu caso, a trilha foi Estopim e Love Rita Lee.
Já essa foto que postei foi clicada por Gal Oppido para o segundo álbum de carreira da cantora, , de 1994. Eu sempre achei uma foto linda. Não parece um camafeu?

4 comentários:

  1. parece um camafeu!

    muito bom mesmo esse trecho da entrevista. Não conheço nada do seu trabalho (!), nunca me interessei, por eu não ouvir mta coisa nesse estilo (ou que eu imagino que seja o dela). Mas parece ser uma pessoa interessante sim..

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  2. A Ná é um máximo! Ela é muito, muito, muito tudo de bom!

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  3. Kika,
    A Ná foi do Grupo Rumo que foi um grupo paulistano de música alternativa no final da década de 70 e durante os 80. Eles faziam uma música meio falada, com textos riquíssimos e nada, nada careta. Havia toda uma galera cantando muito paulistanamente naquele tempo: Arrigo Barnabé e sua "Clara Crocodilo", Itamar Assumpção e as Orquídeas Selvagens (único), eu curto porque foge totalmente do que costuma ser a música brasileira, comercial, of course.

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  4. Lu,
    Pensei em vc também enquanto pensava na Ná. Lógico! rsrsrs

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