quarta-feira, 1 de abril de 2009

Joie de vivre

Pretendo discorrer a respeito de uma experiência que pode ser incomum e mesmo difícil de ser compreendida. Trata-se de um sentimento muito particular.

Quem já viveu algum período de desemprego, e depois voltou ao mercado de trabalho, deve ter conhecido, talvez pela primeira vez, aquela que poderia ser chamada de a alegria de pagar as contas. E, isso, mesmo que seu salário não seja generoso e sirva tão somente para a garantia do mínimo necessário para sobreviver com alguma dignidade. Aliás, o problema do desemprego se põe de modo o mais contundente nessa condição humana em que o trabalhador, e agora uma pessoa desempregada, passa a não ter uma vida decente, portanto, deixa de ter o que é próprio ao âmago mesmo da dignidade, a saber, o merecimento de respeito por minhas qualidades, e devemos entender como parte integrante desse respeito viver bem, ainda que minimamente, como no caso de a pessoa poder pagar as contas.

Falo disso porque hoje fui ao caixa eletrônico e digitei a opção de pagamento de contas por leitura de código de barras. Aqui, sou obrigado a confirmar que há de fato praticidade em tal operação (não fiquei em uma fila, por exemplo), mas a mesma praticidade é também um logro, afinal, o operador do equipamento (o próprio cliente) digita inúmeros comandos para que a máquina possa finalizar a operação e expedir o recibo do pagamento. É bom lembrarmos que estamos trabalhando no lugar de alguém e é importante não esquecermos que um bancário ficou desempregado por conta disso.

Após efetuar o pagamento de algumas faturas, consultei, por fim, meu saldo: a soma na minha conta havia diminuído substancialmente, nada mais natural depois da distribuição dos vários pagamentos efetuados. Portanto, a cena tinha tudo para parecer um triste episódio do meu cotidiano, mas não era esse o sentimento que eu experimentava.
Eu entendia, ao contrário, que estava tudo certo: paguei pelos diferentes serviços que me foram prestados com o dinheiro que recebi pelo serviço que também presto. Tudo ali era ainda merecimento, respeito e, por essas razões, tudo me pareceu correto. Quando temos dignidade, sentimos que estamos vivendo bem. A isso podemos chamar alegria de viver.

2 comentários:

  1. É, querido, está na Bíblia, em algum lugar: pagar as contas com nosso próprio suor dá alguma dignidade mesmo.... a do humano, a mínima... mas como dizem os Titãs: a gente não quer só comida....

    ResponderExcluir
  2. Lilian,

    Não tinha visto esse seu comentário antes. É verdade a gente quer mais e eu acho que nós vamos ter!

    ResponderExcluir