segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Os heróis da Pátria são apenas gente como a gente

Eu agora estou lendo um livro que me caiu nas mãos muito por um acaso. Eu já ouvira falar do sucesso que esse escritor, o jornalista Laurentino Gomes, e seus livros sobre o período da monarquia no Brasil estão fazendo. Ele tem tido a boa sorte do marketing dos títulos estar a seu favor, evidentemente, pois optou por nomeá-los com o ano de cada período que retratou, ou seja, primeiro foi o 1808 (ano da chegada da família real no Brasil) e agora o 1822 (ano da independência do Brasil). Mas os seus livros são muito mais do que puro marketing.
O primeiro não li ainda, mas vou ler! Comecei a ler, na sexta-feira, 1822: como um homem sábio, uma princesa triste e um escocês louco por dinheiro ajudaram D. Pedro a criar o Brasil, um país que tinha tudo para dar errado, e agora estou na metade do livro. É um livro de narrativa fluente e agradável: essa é a primeiríssima qualidade do mesmo. A segunda é uma qualidade menos óbvia, mas que alguns livros, não muitos, podem também revelar: eu penso que esse livro foi escrito com muito amor.
E como é bom ler um livro feito assim!
Muito já se disse desse livro, assim como do anterior, em todos os canais de comunicação. Não preciso dizer muito mais, mas posso dar notícia de uma ou outra impressão de leitor.
Eu concordo, por exemplo, que as principais qualidades do autor como jornalista podem mesmo ter colaborado para aquela característica muito positiva do livro a que já me referi e que é a sua fluidez. Afinal, o livro resultou de todo um excelente trabalho de investigação, e seu autor nos conta que sua experiência em reportagens do gênero muito o ajudaram na hora de transformar todo o material investigado naquilo que se conta no livro. Aqui temos uma verdadeira aula de história, na qual as personagens do episódio da independência do Brasil aparecem vivas e dinâmicas, porque elas tornaram-se personagens verdadeiramente humanizadas, e, assim sendo, muito próximas de cada um de nós. Essa é uma particularidade que faz com que, sim, ao término de cada capítulo eu tenha estado emocionado.
Quando fui contar essa circunstância a um amigo, ele me disse que isso talvez se devesse a um certo patriotismo em mim latente. Mas não acho que eu seja assim tão patriota e tampouco que isso aconteça por se tratar da história da minha pátria. Penso que isso se dá muito mais por essa história, que de fato é a do país em que nasci e vivo, ser uma história que é feita por gente e que veio de outros lugares desse mesmo planeta que habitamos, como o próprio Dom Pedro I, um português.
Por exemplo, o livro nos faz pensar muito detidamente nessa figura de Dom Pedro I, que, com apenas 23 anos, foi um dos protagonistas do episódio da independência. Curiosamente, quando eu lia essa informação da pouco idade que ele tinha, eu estava no metrô, em frente a um rapaz que aparentava ter essa mesma idade e fiquei pensando: Imagine! Ele era da idade desse menino, aqui, de bermuda, tatoo e dreads no cabelo. Ou seja, uma pessoa comum.
Outro aspecto bastante didático do livro e que, por isso mesmo, sugere uma reflexão suplementar é quando, por exemplo, o autor compara determinado acontecimento histórico de que está a tratar com os modos como ele já foi retratado, posteriormente, por outros meios. Por exemplo, a figura de Dom Pedro I foi personagem de um filme sobre a independência, da década de 70, interpretado pelo ator Tarcisio Meira e ainda de uma minissérie na TV, tendo, então, como seu intérprete, o ator Marcos Pasquim. Representações tão distintas e mesmo polêmicas e/ou redutoras, nasceram da complexidade da personagem histórica e que suscita e poderá sempre suscitar interesse. E deve mesmo suscitar! Há uma passagem que me fez pensar que Dom Pedro poderia, por exemplo, ter pertencido a minha família:

Gostava de jogar, mas era um mau perdedor. O viajante francês Jacques Arago contou ter sido convidado pelo imperador para uma partida de bilhar quando estava no Rio de Janeiro. Conhecedora do caráter impulsivo do marido, a imperatriz Leopoldina aproximou-se do francês antes que o jogo começasse e cochichou-lhe ao ouvido: “Deixe-o ganhar algumas partidas. Meu marido é bastante colérico.” Arago, que era um excelente jogador, não lhe deu atenção e, em vez disso, ganhou todas as partidas. D. Pedro reagiu de forma desesperada produzindo “uma cena digna de pessoas perversas em uma das piores tavernas de arrabaldes”, segundo o relato do viajante. Em seguida tentou blefar, mas como continuasse a perder, abandonou o jogo irritadíssimo. “De natureza impulsiva, voluntariosa, era sujeito a súbitas alterações de humor e violentas e repentinas explosões que tornavam difícil o seu convívio”, apontou a historiadora cearense Isabel Lustosa. “Eram logo sucedidas por atitudes de franca conciliação, quando dava demonstrações exageradas de arrependimento a quem antes ofendera.”

Ler um livro de História ensina tanto! Ensina-nos inclusive a compreender que o ser humano estará mesmo sempre sujeito a se lapidar, em qualquer tempo, espaço e condição. ;-)

2 comentários:

  1. Este também está na minha lista, suas impressões confirmam que ele deve seguir a mesma linha do "1808" que é bem esclarecedor e apaixonado. Boa leitura!

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  2. Renata querida,
    É isso mesmo: apaixonado e esclarecedor. Como vês, eu estou a fazer o caminho inverso, leio o último e, depois, lerei o primeiro.
    Obrigado e boa leitura para você também! ;-)

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