quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Henry James e as Crianças

Henry James sempre pôde falar com propriedade do assunto que lhe aprouvesse tratar. Afinal, ele alçava qualquer tema ao grau de importância que tinha para ele a própria condição humana. 

Ao menos para mim é visível que na obra de James a condição humana e suas expressões são revestidas daquela dignidade que somente um artista refinado como ele lhes podia conferir.

Ao ir conhecendo suas obras, por exemplo, notamos que a educação das crianças foi um tema de certa predileção do autor. É possível, sem dúvida, observar sua preocupação com essa temática em The Turn of the Screw [A Volta do Parafuso]. Mas, como o chamado "sobrenatural" ali reina, tal circunstância toma praticamente toda a cena,  deixando em segundo plano, por assim dizer, o problema de que aquelas crianças estão mesmo abandonadas a sua própria sorte e dependem daquele amor de empréstimo dos  empregados da mansão.

Em What Maisie Knew [Pelos Olhos de Maisie] temos essa mesma questão posta no palco dos acontecimentos narrativos, mas agora para antecipar algo que mais tarde será muito comum e que ainda hoje o é, a saber: o drama das crianças que passam a ter dois lares depois do divórcio dos pais.
Maisie, por decisão do juiz, viverá com o pai e a mãe (que se odeiam), alternadamente, por períodos de seis meses, portanto, passando metade do ano com um, metade com outro.

Evidentemente, a ironia que perpassa o texto é refinadíssima, em se tratando de um autor como Henry James. Além disso, a observação dos acontecimentos é descrita, sempre pelos olhos de Maisie ou a partir daquilo que ela podia saber, no sentido comum e no sentido figurado da expressão, proporcionando assim algo entre a objetividade própria da inocência de um tal observador, mas associada à compaixão de um narrador que, não sendo piegas, alcança a medida exata da expressão de tal sentimento.

Ele nos desenha um ser humano ainda em formação, mas tendo que aprender a sofrer,  inexoravelmente, porque isto lhe fora posto viver naquelas circunstâncias.

Vejam como esta passagem demonstra isso tudo:

Henry James quando Jovem
Não era, em absoluto, novidade para Maisie que as perguntas feitas pelos pequenos constituem uma curiosa fonte de divertimento para os grandes: com exceção dos assuntos referentes a sua boneca, Lisette, não havia quase nenhuma questão na casa de sua mãe que fosse esclarecida com uma expressão séria no rosto. Nada lhe era tão fácil quanto arrancar uma explosão de gargalhadas das senhoras que lá costumavam reunir-se, e Maisie poderia ter explorado à grande esta sua faculdade se tivesse uma natureza calculista. Por trás de tudo sempre havia algo oculto: a vida era como um corredor compridíssimo com uma sequência de portas fechadas. A menina aprendera que não era uma boa ideia bater a essas portas – se o fazia, vinham detrás delas ruídos zombeteiros. Pouco a pouco, porém, foi entendendo mais e mais, pois aprendia muito com as perguntas de Lisette, que reproduziam o efeito das perguntas que ela própria fazia sobre as senhoras por ela representadas perante a opacidade de Lisette. Pois não era impagável a inocência da boneca? Diante dela, Maisie muitas vezes imitava as senhoras deliciadas. De qualquer modo, havia certas coisas que ela não podia contar nem mesmo a uma boneca francesa. Tudo que lhe era possível fazer era passar adiante suas lições e tentar produzir em Lisette a impressão de que sua vida continha mistérios, ao mesmo tempo que se perguntava se estava mesmo conseguindo dar a impressão, como sua mãe, de esvaecer-se nas brumas do incognoscível. 

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