quinta-feira, 26 de abril de 2012

Lendo sobre Francisco


Terminei agora mesmo de ler um livro que muito me ensinou. Trata-se de uma biografia. Amo tais livros que contam a vida de alguém que mereceu ter sua vida contada. Essa biografia tem um apelo especial porque se trata da vida de um santo. Estou falando de Francisco de Assis, o santo relutante, de Donald Spoto. O teólogo renomado escreveu o livro para demonstrar que toda a vida de Francisco foi de vivência e de elaboração de um processo de conversão, ou seja, essa última não se deu da noite para o dia e daí o “relutante” do título.
O mais importante é que ele utilizou fontes e arquivos inexplorados de Roma, Assis, Greccio e Florença e, inclusive, os únicos escritos de próprio punho de São Francisco e que sobreviveram até os nossos dias.

Eu comecei a ler tal livro, porque o encontrei por um acaso na livraria e justamente quando eu tinha acabado de assistir ao filme Irmão Sol e Irmã Lua (Fratello Sole, Sorella Luna), de Franco Zeffirelli. Um amigo emprestara-me o DVD dizendo que eu devia assistir ao famoso filme, porque ele sabia que eu iria gostar, que era a minha cara. Vejam só! kkkk

O interessante é que, após ler o livro, percebemos que o filme foi bastante fiel a essa história ou ao menos às passagens mais famosas da vida de São Francisco: sua vida libertina na juventude; a participação nas cruzadas; o episódio do abandono da família e do abraço absoluto com a pobreza, quando, então, fica nu na frente do bispo, na praça do vilarejo; o início exemplar da reconstrução da pobre capela onde se deu a sua primeira epifania; a relação de amizade com Santa Clara, bem como toda a vida de abnegação e caridade com os pobres, leprosos e ainda, evidentemente, com os animais.

No entanto, minha decisão em ler o livro ocorreu, sobretudo, depois de eu ter lido esse trecho de sua Introdução, onde o autor nos diz que:

Francisco nasceu em 1182 e morreu em 1226, aos 44 anos. Hoje em dia, acharíamos que desapareceu no apogeu; naquela época, era considerado afortunado por ter vivido tanto tempo. Dois anos após sua morte, foi proclamado santo. A canonização por decreto pode ser uma forma astuciosa de apropriar-se de pessoas notáveis, domesticá-las e isolá-las, transformando-as em propriedade do catolicismo oficial. Francisco, porém, continua a ser de certa forma maravilhosamente embaraçoso para a Igreja e para o mundo. Sua vida e seu exemplo – e não, devo frisar, qualquer coisa que especificamente ele tenha dito ou escrito – possuem uma integridade que desafia nossos preconceitos sobre o que constitui uma vida de virtude, sem falar de uma forma respeitável de encarar a religião.

Agora, que terminei a leitura, vejo que o exemplar está todo riscado. ;-)
É que gosto de marcar as passagens que me tocam profundamente, como, por exemplo, mais essa outra:

Será nossa obsessão contemporânea com a perfeição física menos patológica do que o comportamento do asceta? Novecentos anos depois de Francisco, as pessoas desejam estar satisfeitas consigo mesmas – anseio fadado à decepção, ou pelo menos somente a uma satisfação temporária. Mas, numa época de fé, a negação do físico tinha o objetivo de tonificar o espírito, e não o corpo, de modo que, libertado da indolência e da dependência no prazer da boa comida e bebida, o espírito ficasse preparado e disposto, não a um novo guarda-roupa ou a um romance ideal, e sim ao esclarecimento íntimo, um prelúdio à oração. Nesse ponto, todas as religiões do mundo concordam: é necessário certo domínio sobre as inclinações da carne para que floresça a vida espiritual.


Quanto a Francisco, podemos desejar que suas penitências autoinfligidas não tivessem sido tão imprudentes. Isso talvez porque preferimos que os santos ou sejam perfeitos  em todos os aspectos, ou sejam tão comuns que se conformem a nossa própria estatura e não desafiem nossa indolência espiritual. Mas os santos na verdade são heroicamente apaixonados, e assim como os amantes, às vezes se tornam excêntricos, ou mesmo ultrapassam seus limites; afinal, a santidade não exclui a humanidade. Acima de tudo, entretanto, os santos mantêm os olhos fixos em Deus. Permanecem fiéis, e é por isso que são santos, não por serem invariavelmente modelos de conduta polida ou mesmo imitável.

Não é preciso dizer que chorei em muitas passagens, tomado de carinho e respeito por esse exemplo de ser espiritualizado ao grau máximo.
Por fim, no momento derradeiro da passagem por esse planeta dessa personagem gloriosa da história humana, Donald Spoto, após descrever os últimos instantes de São Francisco, nos diz à guisa de fecho da história:

A radiosa luz azulada da tarde brilhou por sobre o vale e cobriu as colinas acima de Assis. Ao descrever seus últimos momentos, os amigos de Francisco nunca esqueceram um último detalhe: "Muitos pássaros, chamados cotovias, esvoaçaram por sobre o teto da cabana onde ele jazia, fazendo círculos e cantando".


Por essas poucas passagens, e que fiz questão de trazer para cá, penso que já é possível perceber que temos aqui um livro magnífico e à altura do biografado! Leitura edificante no grau absoluto pois nos fala de alguém querido, amado e... santo.





3 comentários:

  1. Josafá, adorei o post. Vc vai me emprestar este livro. Quanto ao filme do Zefirelli, acho o filme bom, mas recomendo assistir Francesco da Liliana Cavani. Ele é intepretado pelo Mickey Rourke, antes de estragar o rosto com aquelas cirurgias plásticas. E dá uma visão mais profunda das transformações que ele provocou na doutrina. Abs Paula

    ResponderExcluir
  2. Adorei o texto, Josafá. Veja também o filme que a Liliana Cavani fez, chamado Francesco. Ela escolheu o Mickey Rourke. Foi uma surpresa, pois ele está extraordinário no papel. Bjs, Paula.

    ResponderExcluir
  3. Adorei o texto, Josafá. Veja também o filme que a Liliana Cavani fez, chamado Francesco. Ela escolheu o Mickey Rourke. Foi uma surpresa, pois ele está extraordinário no papel. Bjs, Paula.

    ResponderExcluir