Um amigo querido enviou-me o link do sítio desse artista que assina como Nabs lá no Devian Art. Embora ele já tenha 29 anos, o que mais me chamou a atenção foi essa espontaneidade e a delicadeza dos seus temas. Os desenhos são vetorizados, e apenas isso já me pareceu positivo, porque eu cheguei a fazer um curso de desenho vetorizado e, assim, sei o quanto é difícil trabalhar com essa ferramenta, mas ao mesmo tempo bastante prazeroso, quando obtemos um bom resultado.
Nabs vive e deve mesmo ser natural de Oman, um país que pertence ao mundo árabe! Vejam vocês!
Uma particularidade do trabalho do rapaz é que acompanha algumas das ilustrações uma ou outra citação, por vezes, trechos de canções e que lhe inspiram o trabalho. Eu trouxe para cá apenas essa citação de uma canção de Madonna e que acompanhava esse imagem do balanço na árvore. ;-)
Ele parece ser alguém jovem de espírito, pois os temas do seu trabalho são joviais.
Aliás, eu não me preocupo com isso, ou seja, de parecer infantil ou gostar de coisas que são de uma sensibilidade infantil, porque tenho notado que somos todos eternas crianças mesmo.
Penso até que isso pode ser muito positivo, e, ainda mais, quando é algo assumido.
Isso, por exemplo, evita-nos ter muita presunção...
E também o mau hábito de alimentarmos em nosso coração o mal do orgulho, sempre tão tormentoso em seus desdobramentos e consequências.
Vocês não podem imaginar minha alegria ao descobrir esse trabalho. Para mim, ele reúne tudo que aprecio: o papel, as cores abundantes, a criatividade ímpar, além daquela necessária comunicação com um universo de simbolização que se aproxima do mistério da espiritualidade.
JenStark, artista que vive em Miami, constrói objetos tridimensionais de bastante impacto. Ela estudou noMaryland InstituteCollege of Art e nos diz quea geometria, a natureza e a matemática têmtudo em comum. Seu desejo transita no interesse pela replicação e pela ideia deinfinito, assim como, naturalmente, reside nohipnótico, o que explica o pertencimento ao seu trabalho desses desenhosóticosque imitammandalase objetos sagrados.
Eu gosto da literatura de Henry James porque ela nos provoca na medida justíssima do que desejamos apreender ou compreender acerca daquelas sutilezas que há em toda relação humana.
No romance A Taça de Ouro, por exemplo, e que agora leio, é isso mesmo o que acontece...
Você é provocado a desejar compreender o que aquelas pessoas de uma classe social elevadíssima, naquele tempo e lugar determinados, ou seja, no final do XIX, começo do XX, na Inglaterra, estão vivenciando em termos de sentimentos e de interesses.
A focalização do narrador é a determinação de para onde podemos ir nessa compreensão, ou seja, no sentido de até onde...
Isso tudo por que podemos entender o que nos é dito como vontade de uma determinação da própria autoria, mas também de sua narratologia, portanto, como uma construção do desejo de conceder liberdade a cada personagem, naquilo que determinaria o fator da exposição de cada qual, e, ainda, como aquilo que pode ser vivenciado dentro de uma certa liberdade do leitor, que lhe é concedida, para que possa elaborar seus próprios julgamentos. Contudo, esses últimos só podem ocorrer no momento a posteriori, ainda que, inicialmente, isso pareça acontecer simultaneamente...
Pois bem, não acho que eu esteja me fazendo compreender, embora isso não seja um problema aqui, afinal essa postagem não é uma aula de literatura. É apenas um impressão de leitura. rsrsrs
Assim sendo, quero registrar, de todo modo, que ler um romance assim não é uma experiência fácil, porque todo esse exercício exige uma certa disponibilidade, e que, em nosso tempo, dependerá, sobretudo, de uma certa dose de generosidade. Afinal, nessa experiência será necessária a intenção subjacente de um aproveitamento absoluto do próprio tempo dedicado à leitura.
Vejam o trecho abaixo: ele não é um exemplo disso tudo que eu tentava dizer mais acima?
- Parece-me que tivemos dias tão lindos juntos que espero não ser um choque para ti quando perguntar se poderia me ver, com alguma satisfação, como esposo - Como se soubesse que ela não poderia, obviamente não poderia, nem um pouco graciosamente, e fosse ou não responder apressada, ele dissera um pouco mais; quase como se sentisse que deveria ir pensando antecipadamente. Colocara a questão da qual não havia como recuar e que portanto representava o sacrifício de suas embarcações, e o que mais disse significava o impulso redobrado da chama que tornaria certa a combustão. - Isto não é súbito de minha parte, e em alguns momentos eu me perguntei se tu não achavas que eu estava em vias de fazê-lo. Estou assim desde que saímos de Fawns, realmente comecei quando estávamos lá. - Ele falava devagar, dando-lhe, como desejava, tempo para pensar; ainda mais porque isso a estava fazendo olhá-lo atentamente, e fazendo-a também, num grau notável, parecer "bem" enquanto fazia isso; uma consequência grande e, até agora, feliz. De qualquer modo ela não estava chocada, coisa que ele vira apenas como uma humildade bonita, e Adam Verver lhe daria tantos minutos quantos ela quisesse. - Tu não deves pensar que estou esquecendo que não sou jovem. - Ah, não é isso. Eu é que sou velha. O senhor é jovem. - Foi o que ela respondeu a princípio; e num tom que indicava ter aproveitado seus minutos. A resposta não fora exatamente ao ponto, mas foi gentil: o que ele mais desejava. E nas palavras seguintes ela manteve a gentileza, manteve a voz clara e baixa e o rosto sem franzir. - Também acho que estes dias foram lindos. Eu não deveria ser grata a eles se não pudesse, mais ou menos, imaginar que iriam nos trazer a isto. - Pareceu a Adam Verver que ela havia avançado um passo para encontrá-lo, e que ao mesmo tempo continuava imóvel. Mas sem dúvida isso apenas significava que Charlotte estava, séria e razoavelmente, pensando - exatamente o que ele desejara que ela pensasse. Se ela pensasse apenas o bastante, provavelmente pensaria em concordar com ele. - Parece-me - prosseguiu ela - que é o senhor que precisa ter certeza. - Ah mas eu tenho certeza. Em questões importantes eu nunca falo quando não tenho. Então, se consegues encarar tal união, não precisas se preocupar nem um pouco.
A primeira vez que eu vi um filme considerado cult ou de arte ou alternativo ou independente (são tantos os nomes que usávamos, então, para diferenciar esse cinema de autoria daquele do cinema a que chamávamos "enlatados americanos" ou aos moldes de Hollywood, da indústria norte-americana).
Pois bem, nessa tal primeira vez, lembro-me que eu tinha apenas 16 anos e não entendi nada. rsrsrs
Na verdade, eu formei minha sensibilidade para o universo cinematográfico, esse que afinal tinha algo a dizer acerca do humano e para o humano mais sensível em cada um de nós, no Cineclube Oscarito, no Cineclube do Bexiga, no Cine Bijou. Alíás, cheguei a trabalhar no Cineclube Oscarito, depois no Elétrico Cineclube e depois no Veneza Cineclube (antigo Cineclube do Bexiga). Todos eles, assim como o Cine Belas Artes, não existem mais! Tudo isso foi muito importante, assim como a experiência na Assessoria de Imprensa da Pandora Filmes (já nos anos 2000). E, isso tudo foi importante, sobretudo, porque a experiência de fruição do universo cinematográfico, na década de 80 e depois ainda nos anos 90, passava por esse ritual de ir a uma sala de cinema. Sim, naquele tempo, os filmes não eram baixados dos computadores. rsrsrs
Estou falando disso porque queria divulgar junto aos cinéfilos de plantão, um livro que comecei a ler por motivos muito particulares: eu precisava conhecer algo que nesse período de que tratei aí em cima eu não vivenciara. E explico-me: nós jovens daquele tempo costumávamos discutir cinema, preferências e gostos e estéticas desse ou daquele diretor e/ou escola(s), nos halls desses cineclubes. Isso incluia também a experiência de frequentar a excelente programação do Cineclube da FGV, que já ia me esquecendo de citar. Isso tudo para dizer que, enfim, não éramos leitores ávidos dos críticos de jornal. Contudo, foi nesse período que atuou na área da crítica de cinema, Edmar Pereira, e que trabalhou cerca de 20 anos no Jornal da Tarde. Luiz Carlos Merten lançou, em 2006, um livro pela Coleção Aplauso-Cinema-Brasil, da Imprensa Oficial, no qual ele organizou e apresentou uma série de críticas desse jornalista e que são uma delícia de ler, sobretudo para quem conhece os filmes a que ele se refere em cada uma, ou mesmo para quem deseja conhecer o suprasumo do cinema naquele período e que, portanto, poderá ler as críticas e depois ir atrás dos DVDs desses filmes todos de que ali ele trata.
Quando eu comecei a escrever minhas críticas na página DCinema do Diário do Comércio, recentemente, alguém muito generosamente comparou meu estilo ao desse crítico e foi por isso que eu precisei preencher essa lacuna, evidentemente. É claro que o seu trabalho não tem comparação e eu, graças a Deus, ainda tenho muito a aprender para chegar a seus pés. Estamos vivos para isso, certamente, não é mesmo?
Para suscitar em você o desejo de ler esse livro, reproduzo um trecho exemplar da verve desse autor. Em tempo: o livro chama-se Críticas de Edmar Pereira - Razão e sensibilidade. Trouxe para cá esse trecho, porque resume primorosamente o tom de seu trabalho. Trata-se de um excerto de um texto chamado Autobiografia:
(...) Crítico para que serve? Passa-se pela magia e fascínio de Hollywwod. Descobre-se que isso não tem nada a ver, em cine-clubes, cursos de cinema, conferências, seminários. E, as vezes devagar, as vezes derepentemente, descobre-se que mito e desmistificação podem ser cara e coroa. A gente é as duas coisas, Cantando na Chuva e Acossado. Ou Casablanca e Hiroshima, meu Amor. Ou O Encouraçado Potenkim ou O Iluminado, Cidadão Kane, A Terra, Francisco, o Arauto de Deus, Rastros de Ódio, Roccoe Seus Irmãos, Deus e o Diabo na Terra do Sol, Vidas Secas, A Noite de São Lourenço, A Rosa Púrpura do Cairo. Ou Monsieur Verdeoux ou Jules et Jim. Ou etc, etc, etc... Natural também é descobrir a correlação existente entre a fantasia dos filmes e a realidade do mundo. De posse desta descoberta, o crítico faz projetos do alto de seu orgulho que ele acredita iluminado: dialogar com as pessoas usando o cinema como álibi. Para valorizar os filmes, as ideias, a estética quando coincidem com sua sensibilidade, com o seu projeto de estar no mundo. Crítico é por [natureza] pretencioso? Sim - ou do contrário ficaria satisfeito em ser só espectador bem informado, sem a preocupação de informar a ninguém sobre o que acha e pensa. Ou sobre o que acha e pensa que os outros podem achar ou pensar. (...) É preciso estar atento, e se possível, forte. Para ver de olhos e coração bem abertos, porque assim as possibilidades de prazer serão sempre mais amplas.
Não vou reproduzir mais nada aqui, porque quero que você compre e leia o livro. Quero também pedir, por gentileza, que você visite a página do DCinema e leia minha mais recente crítica ali, a do filme Borboletas Negras, que estreia nessa sexta-feira nos cinemas de São Paulo.
Quem frequenta esse blog há muito tempo sabe o quanto eu curto papercut. Então, sempre estou procurando novos artistas que se utilizam dessa técnica mundo afora. Dessa vez, qual não foi minha surpresa quando me deparei, em vários sítios, com a arte do artista espanhol Lorenzo Duran. É que ele abandonou o papel e prefere utilizar a técnica tendo como suporte, para essa arte de recortar silhuetas, as folhas de diferentes plantas. Depois de lavá-las e secá-las, ele vai recortando seus desenhos, utilizando-se de diferentes técnicas, desde a do Picado espanhol, passando pelo chamado Jianzhi chinês ou o Scherenschnitte alemão, até o Papercutting suiço.
Não é uma coisa admiravelmente delicada e de resultados impressionantes?
Sim, o efeito é belo e ficamos contentes de conhecer essa folhas secas ou não.
Penso que, abrir um livro e encontrar uma delas dentro, deve ser de um encantamento como só o experimentam as crianças muito novas e que vivenciam aquela surpresa agradável de quem acabou de chegar ao mundo! ;-)
Clark Gable and Claudette Colbert
in It happened one night
Na noite passada, eu tive uma noite dos sonhos.
O que quero dizer com isso?
Talvez algo muito simples: ela foi uma noite em que tive contato com pessoas amigáveis, em um ambiente arejado e simpático, com boa música e bom vinho.
Se eu for ainda mais sincero, devo dizer que, provavelmente, muito dessa sensação de sentir aquela noite uma coisa própria do universo dos sonhos se deve a um encontro em particular e que se deu ali, em meio àquelas pessoas.
A verdade é que até hoje não consigo compreender o que aproxima as pessoas. rsrsrs
Desconfio que há qualquer coisa invisível, e que diz mais que o visível, nesse tipo de encontro feliz entre duas pessoas e que são espíritos afins.
Afinal, se nunca se viram antes, como, então, pôde ser tão natural a aproximação, quando a intimidade já estava estabelecida em menos de 5 minutos?
Desconfio, fortemente, que, na verdade, esses são sempre reencontros.
Quem sabe mesmo um reencontro que se dá entre pessoas que não se viam há muitos séculos.
Então, um reconhece o outro primeiramente, afinal, gente de boa memória lembra do que se passou mesmo em priscas eras...
As palavras que se trocam inicialmente, nesse tipo de reencontro, são as mais suaves que se pode ouvir, qualquer coisa como: "Meu nome é tal. Qual é o seu? "
E isso pode significar “acho você uma pessoa encantadora e super atraente”.
E por um instante é isso mesmo o que se houve e nada mais, mesmo que alguém esteja dizendo um nome, enquanto você também diz o próprio nome.
Em algum momento, se ouve uma canção romântica e que começou a tocar não se sabe o porquê.
Talvez fosse apenas por que era preciso ter uma trilha para um tal encontro memorável.
Encontro em que se sorriu gratuitamente quase todo o tempo e no qual as gentilezas foram o principal cartão de visitas, assim como foram seladas as promessas de um novo reencontro, para breve.
Em uma noite como essa, quando você está voltando para casa com algum amigo ou amiga, em algum momento, ouvirá: "Ei, eu estou falando com você. Você está no mundo da lua?"
I have never dreamed it Have you ever dreamed a night like this I cannot believe it I may never see a night like this When everything you think is incomplete Starts happening when you are cheek to cheek Could you ever dream it I have never dreamed, dreamed a night like this.
Na semana passada, eu falava, aqui, de um pesadelo que tive e que muito me assustou, mas que também muito me ensinou. No facebook, ao ler minha postagem, um amigo chegou a citar um personagem de um autor de romances e contos de terror, o H. P. Lovecraft. No entanto, eu não curto terror, mesmo os contos de Edgar Allan Poe, quando são muito assustadores, eu tenho dificuldade em acompanhar. rsrsrs
Pois bem, curiosamente, eu dizia isso para esse meu amigo, citando Poe, na semana passada, e dizendo-lhe também que eu gostava mais do poeta Poe do que do contista (e que nenhum crítico de literatura me ouça! rsrsrs)
Agora, começo a ler um livro em que Edgar Allan Poe é um personagem da história contada ali e que é um thriller. De thrilers e histórias de detetive eu gosto, sempre.
Aliás, ouvi dizer que elas, as histórias policiais, têm um efeito terapêutico para pessoas que perderam tudo. Muitos desempregados, por exemplo, leem romances policiais: as pistas para desvendar o “crime” funcionam como um elemento de busca da própria identidade e condição social perdidas.
O livro que estou lendo é de um autor norte-americano chamado Louis Bayard. Ele vive em Washington e escreve para o New York Times e o Washington Post. E para os sites Nerve.com e Salon.com, entre outros.
Nessa história que estou lendo, tudo é bastante instigante, pois Poe é um jovem cadete de uma tradicional Academia Militar dos EUA, onde ocorreu um crime: um outro cadete, que aparentemente se suicidara, é encontrado morto e, logo depois, seu corpo é profanado: retiram-lhe o coração. Um policial aposentado é escolhido para levar à frente as investigações e escolhe Poe como seu ajudante. Uma das passagens mais bonitas é quando Poe se apaixona por uma jovem, irmã de um dos suspeitos do crime.
Embora, quando contado assim, tudo pareça muito com coisa de adolescente (o que de fato o personagem praticamente é), na verdade, a história é séria e pode nos levar a muitas reflexões, experiência que eu vivi ao ler esse trecho e que acho magnífico:
(...) Miss Marquis ouvia tudo, o bom e o mau, com uma equanimidade quase sacerdotal. Em sua pessoa encontrei personificado o princípio especificado por Terence: Homo sum, humani nil a me alienum puto. De fato, seu espírito de indulgência encorajou-me tanto que, depois de muito pouco tempo, me senti livre para confessar que minha mãe vem mantendo uma espécie de presença supranatural quando estou dormindo e acordado. Nenhuma memória vivente ela me legou em herança, confessei, e, no entanto, ela persiste com tenacidade como memória-espírito. Ao ouvir isso, miss Marquis olhou para mim com grande prontidão. “Você quer dizer que ela fala com você? O que ela diz?” Pela primeira vez naquela manhã, tornei-me reticente. Por mais que ansiasse por contar-lhe, mr. Landor, sobre aquele misterioso fragmento poético, eu não pude. Nem parecia, de modo algum, que ela fosse pedir uma elaboração adicional. Depois de colocar a pergunta, ela a abandonou muito rapidamente e concluiu murmurando: Eles nunca nos deixam, não? Aqueles que vieram antes de nós. Eu gostaria de saber por quê”. Vacilando, então, falei das teorias que havia proposto para essa mesma questão. “Há momentos”, declarei, “em que creio que os mortos nos assombram porque os amamos muito pouco. Nós os esquecemos, percebe?, não por querer, mas assim fazemos. Toda a nossa tristeza e compaixão dura por um tempo, e no intervalo, por mais longo que dure, creio que eles se sentem cruelmente abandonados. E por isso clamam por nós. Eles desejam ser lembrados em nossos corações. De modo a não serem assassinados duas vezes.” "Em outros momentos”, continuei, “acho que os amamos demasiado. E como consequência nunca ficam livres para partir, porque nós os carregamos, nossos mais profundamente amados, dentro de nós. Nunca mortos, nunca silenciosos, nunca apaziguados.” “Aparições”, disse ela me olhando de perto. Sim, suponho que sim. Mas como se pode dizer que retornaram quando nunca foram embora?” Ela passou a mão em sua boca – cujo propósito, só pude determinar quando ouvi o arroto de alegria ruidosa transbordando de seus lábios. “Por que é, mister Poe, que eu passaria, numa próxima ocasião, uma hora com você em” – de novo ela gargalhou – “em reflexões das mais melancólicas e não gastaria um outro minuto falando de trajes e bugigangas e das coisas que tornam as pessoas felizes?” Um brilho solitário iluminava a base da montanha que fitávamos. Miss Marquis, contudo, voltou sua atenção para outro lado e, com a ajuda de um galho não pontudo, começou ociosamente a desenhar figuras abstratas na borda do granito. “No outro dia”, ela disse por fim. “No cemitério...” [o primeiro encontro deles fora num cemitério e ela passou mal, chegando a desmaiar.] “Não precisamos falar disso, miss Marquis.” “Mas sabe, eu quero falar disso. Quero lhe contar...” “Sim?” “Quão grata fiquei. Abrir meus olhos, é sério, e encontrar você ali.” Ela arriscou um olhar em minha direção, depois deixou escapar de uma vez. “Olhei profundamente em seu rosto, mister Poe, e encontrei ali algo que jamais havia esperado. Nem em mil anos.” “O que você encontrou, miss Marquis?” "Amor”, ela disse.
Gostaria de falar de uma experiência que já se tornou inesquecível para mim.
Para ser sincero eu também vivi isso outras vezes ao visitar uma instalação de arte. Por exemplo, quando, ainda adolescente, fui com professores e coleguinhas de escola visitar uma Bienal, lá no Ibirapuera. Na época, uma artista argentina apresentava uma instalação em que os visitantes deviam tirar os sapatos, calçar pantufas apropriadas, acolchoadas com algodão, e entrar em uma imensa tenda, em cujo teto havia diversos tecidos brancos, de materiais como algodão, seda, transparências inúmeras, todos intercalados com espaços em que se via um fundo dark. O visitante devia entrar segurando um espelho na altura do olho, acima do nariz, e andar cuidadosamente olhando para as imagens que se refletiam em tal espelho, no interior, portanto, de uma Nuvem, como era chamada essa instalação. Assim, por vezes sentíamos que andávamos mesmo em uma nuvem, noutras que caíamos em um abismo de escuridão... Pena que não me lembro do nome da artista, nem ao certo em qual Bienal isso se deu. O que ficou foi o inesquecível da relação com a arte a partir de algo muito simples no aparato disponível e que, ainda assim, proporcionou uma experiência de transcendência muito significativa, sobretudo para um adolescente.
Agora, na meia idade da vida, passei por algo semelhante: fui visitar a exposição Oneness, de Mariko Mori, uma artista japonesa que consegue reunir tecnologia eletrônica, religião e até mesmo a estética da fotografia de moda, tornando tudo isso pleno de sentido no seu trabalho. Fica evidente a influência dos mangás, por exemplo, nesse trabalho, sobretudo nos vídeos em que ela aparece vestida como os personagens típicos dessas histórias em quadrinhos. No entanto, o que mais me chamou a atenção foi o seu desejo sincero de proporcionar aos visitantes um contato com a energia cósmica universal, o que só se faz possível quando você relaxa e se concentra em vibrar nessa direção.
Nesse sentido, aconteceu algo muito bacana na minha visita à exposição. Quando eu cheguei, peguei a senha para entrar na Wave UFO, gigantesca nave que está estacionada no saguão da casa, mas naquele momento a porta da nave estava enguiçada. E, ainda, as outras duas pessoas que entrariam comigo desistiram de esperar o seu conserto. Eu mantive-me firme no propósito de entrar ali e esperei. Assim, pude ter uma experiência única: pude observar no teto da nave apenas as cores do meu estado emocional registradas pela leitura de eletrodos fixados na minha testa e que permitiam a projeção de tais imagens no teto da nave.
Além disso, quando fui conhecer os seis personagens da obra Oneness - que dá nome à exposição e é outra obra interativa - como eu fora visitar a exposição sozinho, precisei juntar um grupo de mais cinco pessoas, para que os seis pudessem se ajoelhar em frente a cada um dos também seis personagens que compõem a obra, e, colocando as mãos no coração de cada um deles, tivessem a surpresa da interação que os bonecos com carinha de ETs, moldados em Technogel, proporcionam em grupo ao grupo.
Eu concluo que vivi uma experiência muito salutar para o espírito, pois pude conhecer uma obra que reúne beleza, oportunidade de reflexão sem par, além da necessária lição de que é possível utilizar a tecnologia também a favor da nossa própria espiritualidade! Enjoy it!
A exposição ficará em cartaz até 16 de outubro no CCBB – Rua Álvares Penteado, 112 – Centro.
O pior pesadelo é aquele que se configura na sequência de imagens de uma perseguição. Sejamos nós os perseguidos e sentiremos sempre que somos inocentes, mesmo que, no fundo, não sejamos tanto assim. Pois, de onde viria, então, esse horror que se apossa de nós durante a fuga e ainda quando, finalmente, conseguimos nos esconder?
E qual não é o pavor quando se aproxima o momento de os perseguidores arrombarem as portas do esconderijo!
No clímax do desespero, o desejo é de gritar, mas, então, não há voz na garganta.
Quem olhasse o nosso corpo deitado na cama, se apiedaria, pois sua posição em tal momento é constrangedora: um agarrar-se ao travesseiro, um rosto que é todo esgar.
A providência divina, por fim, permite o despertar, o qual, inicialmente, alivia, embora não o faça de todo, pois, pobre de nós, acordamos desconfiados e nos perguntando como pôde ser tão real toda aquela encenação e sua cenografia!
Por fim, pressentimos que todo aquele que é inteligente deve desconfiar que tal Mistério não é semelhante ao dos thrillers.