quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Fritando rabanadas

No último dia 24, eu preparei quitutes para o almoço de natal, no dia seguinte, oportunidade em que a família inteira estaria reunida em torno da matriarca.
Enquanto eu fritava as rabanadas, fui acometido de uma espécie de insight e que vou tentar descrever por aqui como se deu.
É que eu me vira fazendo uma tarefa a que me encarrego de pôr termo todos os anos e que se revela um sucesso de público no seio familiar.
Minha família tem crescido, na medida em que meus irmãos trazem novas pessoas ao mundo. Depois de uma baixa (meu pai que se foi faz 5 anos), já somos 25 pessoas, uma vez que novos membros entram na família, seja porque os bebês nascem, seja porque os meus sobrinhos mais velhos iniciam namoros e surgem assim simpáticos agregados!
Quem já experimentou fritar rabanadas sabe que se trata de algo muito fácil embora trabalhoso. Há o processo de preparar o leite no qual mergulhamos as fatias do pão. Você pode temperá-lo com especiarias (raspas de limão siciliano, canela em pau, raspas de gengibre, anis-estrelado, cravo etc.) ou misturá-lo simplesmente com vinho e/ou leite condensado. Após a etapa do mergulho da fatia de pão nesse leite, há que se escorrer o excesso em uma peneira, envolvê-la no ovo batido e levar ao óleo quente para fritar. Deixa-se, então, escorrer o excesso de óleo de cada fatia em um papel absorvente e, por fim, é preciso cobrir de açúcar e canela cada uma.
Eu fiz cerca de 60! É uma atividade solitária.
Assim sendo, durante a função eu tento me concentrar, buscando ter bons sentimentos e sensações, pois eu acredito fortemente que aquilo que pensamos ou sentimos, enquanto fazemos um prato, é transmitido de algum modo àquela matéria tão vulnerável do alimento e que, afinal , será absorvida por outro organismo.
Eu sempre passo mal quando como alguma coisa preparada, por exemplo, por alguém que esteja a sofrer alguma dor. É uma realidade do meu histórico de ingestão de alimentos. E eu não desejo isso para ninguém.
Mas nós não somos apenas felicidade e alegria, of course.
Então, quando eu estava fritando a 45ª rabanada eu comecei a me cansar e pensei: Será que eu faria isso para qualquer um, ou seja, eu me dedicaria ao preparo de iguarias para pessoas desconhecidas, enfim, pessoas que não pertencessem a minha família? Imediatamente, então, senti um estremecimento e tive naquele exato momento a plena convicção de que, sim, eu faria com aquele mesmo amor e carinho rabanadas para qualquer ser humano.
Foi algo tão intenso - o constatar essa possibilidade - que senti uma alegria plena!
Quando não tivermos mais no nosso meio nossa mãe e se por um acaso a família se debandar, deixar de se reunir no natal, eu poderei fritar rabanadas para desconhecidos com o mesmo amor.
Ter a certeza que servir com paixão é o que há de melhor nesta vida renovou a minha energia, quase não percebi o fim da tarefa de fritar rabanadas e já me envolvi com o preparo do manjar de coco.

Como diria Saint Germain: Eu sou a inesgotável energia e inteligência sustentando-me!
Que assim seja, graças a Deus!

Happy New Year to you.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Like this. Rumi by Tilda Swinton


Se alguém lhe pergunta
Como pareceria a perfeita satisfação
de todo o nosso desejo sexual,
levante-lhe o rosto e diga:
Assim.

Quando alguém menciona a graça
do céu noturno, suba no telhado
e dance e diga:
Assim.

Se alguém quer saber o que o "espírito" é ,
ou o que  significa a "essência de Deus",
incline a cabeça em direção a ele ou ela.
Mantenha seu rosto colado ali:
Assim.

Quando alguém cita a batida imagem poética
De nuvens que passam e descobrem a lua ,
Afrouxe lentamente, laço por laço, as fitas de seu robe:
Assim.

Se alguém se pergunta como Jesus ressuscitou os mortos,
não tente explicar o milagre.
Beije-me nos lábios:
Assim. Assim.

Quando alguém perguntar o significado de
"morrer por amor ", aponte
aqui.

Se alguém perguntar o quão alto eu sou, feche a cara
e indique com seus dedos o espaço
entre os vincos de sua testa .
Esta altura.

A alma, por vezes, deixa o corpo, os retornos.
Quando alguém não acredita nisso ,
Retorna à minha casa .
Assim.

Quando os amantes gemem,
eles estão contando nossa história.
Assim.

Eu sou um céu onde vivem espíritos .
Olhe fixamente para este azul que se aprofunda,
Enquanto a brisa diz um segredo.
Assim.

Quando alguém pergunta o que há para fazer ,
acenda uma vela nas mãos dele
Assim.

Como o cheiro de José chegava até Jacó ?

Huuuuu

Como voltou a visão de jacó ?

Huuuuu

Um sopro limpa os olhos.
Assim.

Quando Shams voltar de Tabriz,
Fará sua cabeça aparecer no vão
da porta para nos surpreender

Assim.

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Jesus me ama: êta nóis!

Mesa  posta: comemoração do meu aniversário,
no último dia 7 de dezembro, com pessoas que me amam
Hoje eu passei por uma experiência curiosa e que me fez refletir sobre tanta coisa!

Andava contente pela rua, na companhia de uma amiga, e veio um rapaz em nossa direção, parecendo que nos pediria alguma informação: isso é tão comum no centro da cidade de São Paulo...

No entanto, para nossa surpresa, se dirigindo a mim, ele me perguntou o seguinte:
- Você nunca foi convidado a ir a uma igreja evangélica?
Evidentemente, eu respondi:
- Claro, inúmeras vezes!
Eu sorria, mas também demonstrava que não iria lhe dar uma atenção prolongada.
Ele, então, completou:
- Pois vá a uma igreja, Jesus te ama e vai te libertar do homossexualismo.
Sorrindo muito e muito sinceramente lhe respondi:
- Sim, claro que vai!

Saímos andando. Eu e minha amiga para um lado, enquanto ele também seguiu seu caminho.
Minha companheira estava chocada e ainda mais do que eu. Ela dizia:

- Que babaca!

Eu lhe disse:
- Um coitado, né? Vamos combinar que para uma pessoa se dirigir a um desconhecido com esse papo, só pode ser porque ficou muito incomodado e que isso (ver um homossexual tranquilo e feliz andando na rua sem nenhuma preocupação em mascarar seu modo de ser, sua condição humana) repercute muito dentro da sua subjetividade, em relação aos seus próprios fantasmas e, além disso, ainda tem o problema da sua doutrina religiosa e homofóbica, que lhe ensinou que o pobre Jesus se incomodaria comigo tanto quanto ele próprio se incomoda e que por isso Ele me libertaria desta “prisão”. 
Aliás, olha que interessante! Ele vê a orientação homossexual como uma prisão, não é louco isso?
Mas, você quer saber de uma coisa? Eu estou muito admirado não com a atitude dele, mas com a minha! 
Pois, no passado, eu daria o maior sabão no rapaz, me indignaria com a sua fala e com o seu julgamento da minha pseudo-ignorância acerca do amor de Jesus (como, aliás, eu já contei aqui).
Mas veja só, desta vez eu até “concordei” com a figura e tranquilamente, sorrindo!
É que de fato eu, hoje, acredito na eternidade do espírito e eu não imagino que eu vá ser homossexual pela eternidade afora, peloamordeDeus! 
Eu estou homossexual, graças a Deus! E, claro, penso que nesta encarnação a tal “libertação” que ele sugere não vai rolar, definitivamente...
Agora, fora do envoltório físico, do meu corpo material, por favor, vamos pensar alto: a experiência sexual será de outra natureza que ainda eu nem sei qual será! Portanto, vamos cantar pra subir, né?

Pois ele deveria era ficar sabendo que eu, agora, quero é a sorte de um amor tranquilo, como dizia Cazuza!

Na verdade, eu acho que a letra desta canção fala muito do que realmente aconteceu entre mim e este moço evangélico:


quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Poesia Albanesa

Luljeta Lleshanaku 
Já faz um tempo que descobri um blog muito sofisticado: 
Poesia & Lda., que  se propõe a divulgar a poesia produzida em diferentes culturas, inclusive, em culturas das quais dificilmente temos acesso à produção literária.

Hoje eu estava apreensivo com aquela gente linda do Greenpeace que continua presa na Rússia, inclusive com a brasileira Ana Paula, que se encontra entre eles!

Penso que  não por acaso, encontrei neste blog a poesia de LULJETA LLESHANAKU (ler Liublieta), que nasceu em Elbasan, na Albânia, em 1968.

É alguém da minha idade (eu nasci em 1967) e é uma mulher. 
Dois motivos mais do que suficientes para eu me identificar com sua poesia. ;-)

Este poema postado naquele blog por João Luís Barreto Guimarães tem como temática os diferentes modos de ser prisioneiro... 

Enquanto reflito nessa temática, mando as minhas mais sinceras e boas vibrações para que se tenha a melhor solução para o caso, dentre os resultados da audiência que aconteceu ontem em Hamburgo, na Alemanha, no Tribunal Internacional de Direito Marítimo.

Tal audiência ocorreu graças ao  governo holandês, diga-se de passagem, e que quer a libertação do navio Arctic Sunrise – de bandeira holandesa – bem como de toda a tripulação que estava a bordo da embarcação. Que assim seja!


PRISIONEIROS


Prisioneiros
culpados ou não
parecem sempre iguais quando são libertados –
patriarcas destronados.

Este acabou de passar cabisbaixo
pelo portão, apesar de não ser alto
seus gestos como os de um Beduíno
entrando na tenda
transportando às costas o dia inteiro.

Cortinas de algodão, paredes de pedra, o cheiro a cal queimada
levam-no de volta para o momento
em que a guerra fria terminou.

No outro dia, o seu lençol foi pendurado no pátio
como se a ostentar a mancha de sangue
depois da noite de núpcias.

Rostos manchados pelo sol
cercam-no, todos olhos e ouvidos:
"Com o que é que sonhaste a noite passada?"
Os sonhos de um prisioneiro
são pergaminhos
feitos sagrados pelas passagens em falta.

Sua irmã ainda está a descobrir os seus estranhos hábitos:

pedaços de pão escondidos nos bolsos, e sob a cama
o implacável corte da madeira para o inverno.

Porquê este medo?
O que pode ser pior do que a vida na prisão?

Ter escolhas
mas ser incapaz de escolher.
A brasileira Ana Paula é uma das 30 pessoas presas na Rússia após protesto pacífico contra exploração de petróleo no Ártico. Foto: © Dmitri Sharomov/Greenpeace

Você pode assinar a petição pela libertação dessa gente boníssima aqui.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Almoçando com uma amiga

Hoje, eu conversava com uma amiga na hora do almoço e ela ficou muito desapontada comigo.

É que ela me contava uma história e no meio do seu relato desatei a rir.

Meu riso pareceu-lhe desrespeitoso, porque o que ela me contava era o caso de uma injustiça sofrida por uma outra pessoa. Então, quando minha reação jocosa se deu, pareceu à narradora que eu era indiferente propriamente a essa injustiça relatada.

Tive um certo trabalho para lhe explicar que não era do relato que eu rira, mas da forma como ela se revelava profundamente indignada, mais até do que talvez estivesse a própria vítima da injustiça.

Veja bem, não se tratava de algo irreversível ou demasiado, como, sei lá: uma pena de morte imputada a um inocente ou a vitimização própria de quem sofre assédio moral, nada disso...

Era um feito grave, mas corriqueiro até. Tratava-se de algo que, muito provavelmente, a própria pessoa iria superar, no devido tempo. Os responsáveis pelo mal feito talvez nem tivessem consciência absoluta do que fizeram. Erraram porque não sabiam o que faziam, sabe?

Portanto, foram apenas egoístas, como a maioria de nós ainda costuma ser.

Mas, então, por que eu ri, se, ainda assim, de fato tudo era da ordem do lamentável?

É que eu sou muito parecido com esta minha amiga com quem eu almoçava. Provavelmente, quando crianças, ambos sofremos preconceitos diversos e fomos aprendendo a reagir intempestivamente diante de qualquer injustiça e mais: aprendemos a defender "os frascos e os comprimidos" na nossa sede de justiça!

Tarte tatin, a sobremesa
Quando vi que ela fazia o mesmo que eu também faço, aqui e acolá, comecei a rir por que isso me pareceu um tanto ingênuo, embora absolutamente legítimo!

O incrível da nossa ingenuidade é mesmo o quão ela é legítima.

O magnífico da experiência humana é quando não somos absolutamente ingênuos e sabemos que não há culpados completamente, nem tampouco inocentes, mas que todos precisamos cada vez mais aprender um tanto do amor próprio para, então, amar perdidamente e, aliás, sem nenhuma ingenuidade a qualquer um.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Dia do professor

Crianças em uma aula de Yoga (via Humans of Amsterdam)
Faz 13 anos que eu não leciono e com isso quero dizer que não atuo como professor, em sala de aula. Eu trabalhei, anteriormente, como professor. Foram 12 anos lecionando. Na instituição escolar é mais comum observar a incorporação destes papéis: o do aluno e o do professor. Embora há pessoas que estão nas escolas, mas que não pertencem ainda a ela ou mesmo que já não pertencem mais a esse perfil de instituição.

Para mim é mais fácil, hoje, entender o mundo todo como uma escola e que frequentamos, mais amiúde e para o nosso proveito, durante esta experiência corpórea.

Neste planeta estão aprendizes e educadores.  Evidentemente, esses papéis podem ser trocados. Não sabemos, nesta escola que é o mundo, quando deixamos de aprender e de ensinar. Com o tempo, no entanto, é possível perceber que nela quem mais aprende é quem ensina.

Sempre me surpreendo, quando me vejo sendo ainda valorizado por aqueles que em momento anterior me encontraram, na condição de professor, quando eu inclusive ainda não sabia nada saber. Foi o que me aconteceu ao acordar esta manhã: uma ex-aluna deixara uma mensagem na minha time line, no facebook:

Porque foi você, o melhor professor que tive na vida, e porque olhou para mim como todo professor deveria olhar para um aluno, e porque acreditou em mim mais do que eu mesma acreditava. Com todo respeito e admiração. Feliz dia dos professores.

Fiquei emocionado. Afinal, ela está se reportando a algo que, sem dúvida, ocorreu e que ainda pode ser uma atitude possível para o professor. Ou seja, ser um profissional que acredita, respeita e admira a pessoa do aluno naquilo que de fato representa suas possibilidades, algo que está ali como riqueza latente, como promessa de futuro eterno e bom.

Que alegria ser assim reconhecido, mas, sobretudo, tendo sido assim lá atrás, nesse passado próximo - quando também a mim parece evidente que eu assim o era - sem ter precisado “estudar” muito para isso: a não ser na própria escola da(s) vida(s). 

Ah, sim, eu também considero o tanto que há de solidariedade natural da(s) existência(s), bem como o que há aí de possível reencontro. Afinal, tem gente que a gente ama muito facilmente, graças a Deus!

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Amanda McCavour

Amanda McCavour é uma artista canadense que utiliza a máquina de costura no seu trabalho.

O mais interessante é que ela cria seus desenhos e instalações usando como base um tecido que se dissolve na água. Então, ela costura com fios repetidamente sobre esse tecido até que se forme a imagem desejada, por justaposição desse entretecido de fios. Após a dissolução do tecido, resta apenas a estrutura do emaranhado de fios, o que nos dá um efeito de algo efêmero ou prestes a se dissolver, mas que na realidade já é sólido o bastante enquanto estrutura aparente.

Ela diz estar interessada justamente nessa vulnerabilidade dos fios, e em sua capacidade de desvendar o aparente, bem como na força do entretecido na costura. Portanto, nessa conexão entre processos e materiais e do modo como isso se relaciona com imagens e espaços.

Assim, traçando ações e ambientes, através de um processo de repetição, tradução e dissolução, a artista espera marcar o movimento da ausência, em um processo de retomada, de rastreamento, preservando a memória do que se foi ou do que lentamente se desintegra.