sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Nullus dies sine linea

Acaba de passar por aqui, na redação, um jornalista querido, amigo, e que é um erudito. Ele provavelmente iria rir de mim, caso eu lhe dissesse isso, que eu o considero um erudito. No entanto, é como de fato eu o considero, uma vez que do meu círculo de relações, trata-se da única pessoa que conheço pessoalmente e que pode traduzir, por exemplo, São João Crisóstomo, diretamente do Latim.
Assim sendo, acho que posso chamá-lo de erudito. :-)
Pois bem, ele me contou, en passant, que Beauchêne, fundador de uma importante editora francesa dizia: Nullus dies sine linea (Nenhum dia sem uma linha). “Linha” aqui está para texto, uma página de texto escrito ao menos, e, portanto, trata-se de um eufemismo. :-)
Que maravilha seria se levássemos o conselho do editor em conta, pois assim, estaríamos em exercício constante da escrita e se escrevêssemos, todos os dias, uma página, no final do ano teríamos um livro de 300 páginas!
A questão é que é preciso ter o que dizer, ou ao menos saber o que se pretende escrevendo. Não acho necessário que se tenha, necessariamente, um projeto consistente como foram os projetos todos dos grandes escritores e aos quais seremos, por isso mesmo, gratos leitores por toda a eternidade.
Penso que é muito importante ao menos escrever para si mesmo, em um primeiro momento, uma vez que há um Outro em nós que precisa ser conhecido. Afinal, não escrevemos uma linha sequer que não resulte em uma oportunidade de autoconhecimento.
Por exemplo, sempre que vivi crises sérias no meu relacionamento comigo mesmo, ou com amigos, ou com amantes (eu já tive amantes, que estranho! rsrsrs) ou apenas com pessoas da minha convivência, foi escrevendo a respeito que eu resolvi verdadeiros dilemas presentes nessas relações.
O que é a vida senão a busca de solução para algum dilema (algo constante em qualquer relação)?
O que chamo aqui de dilema é algo ainda desconhecido até que o vivenciemos na tal relação, ele se dá tão somente enquanto ainda não podemos aprender a amar como se deve, ou seja, do único modo possível: querendo bem e intensamente, a cada dia, quando, então, a solidariedade na convivência suplanta a desigualdade da disputa.
Estou apostando que isso só se dá pela convivência pacífica, ou seja, depois que todas as diferenças foram compreendidas como constituintes inevitáveis daquilo de que fazemos parte desde a Cosmogonia.

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