Outro dia, eu dizia nesse blog que ouvira da poetisa mineira Adélia Prado, durante um colóquio, a informação de que Santa Teresa de Ávila, após seus êxtases místicos, dizia: "Mais um minuto e eu teria morrido..." Tal personagem santa e histórica fascina a muitos, quer por seu exemplo narrado, quer pelos registros de seus depoimentos. Hoje, descobri que um poema anônimo lhe foi atribuído e que ele foi vertido para o português por ninguém menos do que o nosso poeta humílimo e, por isso mesmo, extremamente sofisticado: Manuel Bandeira.
Hoje, um amigo presenteou-me com uma cópia do poema e, mesmo tendo lido Bandeira na minha graduação, eu não me lembrava desse trabalho do poeta. Eu considerei o texto primoroso na sua construção (é um soneto), bem como na temática. Sinto necessidade de compartilhá-lo nesse espaço.
Penso que ele é uma lição sobre o Mistério absoluto que envolve o Cristianismo, bem como a respeito daquele mesmo Mistério que permite a fé e que é preciso compartilhar se desejamos compreender tal transcendência poética.
[Soneto anônimo / atribuído a Teresa de Ávila, 1515-1582]
Ao Cristo crucificado
Não me move, Senhor, para querer-te,
o céu que me hás um dia prometido;
nem me move o inferno tão temido,
para deixar por isso de ofender-te.
Move-me tu, Senhor, move-me o ver-te
cravado nessa cruz e escarnecido;
move-me no teu corpo tão ferido
ver o suor de agonia que ele verte.
Move-me ao teu amor de tal maneira,
que a não haver o céu eu te amara
e a não haver o inferno te temera.
que a não haver o céu eu te amara
e a não haver o inferno te temera.
Nada tens a me dar porque te queira
pois se o que ouso esperar não esperara,
o mesmo que quero te quisera.
pois se o que ouso esperar não esperara,
o mesmo que quero te quisera.
(Tradução de Manuel Bandeira, 1886-1968)