Uma grande emoção que tenho vivido, desde a última quinzena, tem sido a leitura do romance
Os Trabalhadores do Mar, de Victor Hugo. Tenho compartilhado com meus amigos, no facebook, minhas impressões de tal leitura, bem como trechos dessa obra.
Isso tem sido ótimo!
Outro dia, inclusive, encontrei uma moça no elevador da empresa em que trabalho, com quem tenho pouco contato na vida real, e ela comentou comigo:
- Nossa! Dá uma vontade de também ler o livro, quando a gente lê os trechos que você tem postado no face!
Fiquei contente, porque esse autor é tão pouco lido nos nossos dias! E ele foi, sem dúvida alguma, genial.
Uma das coisas que mais tem acontecido comigo, durante essa experiência de leitura, é eu ficar com os olhos marejados e ter que interrompê-la. Como apenas leio o livro durante o trajeto para o trabalho ou do trabalho para casa, faço a leitura em público, nos vagões dos trens da CPTM ou do Metrô de São Paulo. Hoje também aproveitei para ler o romance na fila de um banco, local em que fui obrigado a aguardar pelo atendimento por mais de uma hora. Que bom que eu estava com o livro. Jamais se aventure a frequentar uma fila durante tanto tempo sem ter um livro para ler!
De qualquer modo, seja no interior de vagões ou em filas, o constrangimento é sempre o mesmo, ter de verter lágrimas, durante a leitura, e perceber que as outras pessoas ficam se perguntando:
- Afinal, o que faz esse homem chorar? O que este livro pode conter de tão triste ou de tão emocionante?
Bem, nesse livro (eu ia dizer filme! hahaha) a história se passa a maior parte do tempo no mar. Em lugares inabitados ou mesmo hostis à presença humana. Lendo o capítulo XIII da obra, O QUE SE VÊ E O QUE SE ENTREVÊ, deparei-me com um trecho com o qual me emocionei, especialmente, porque tive uma sensação que me pareceu antiquíssima: a de visitar um ambiente que é muitíssimo familiar à nossa espécie, apesar de tudo, de todo o estranhamento aparente... Afinal, sim, não podemos esquecer que todos viemos do mar.
Bonne lecture et bonne relecture!
Debaixo dessas vegetações
escondiam-se e mostravam-se ao mesmo tempo as mais raras joias do escrínio do
oceano, os martins, as mitras, os elmos, as púrpuras, os búzios, os estrutiolários,
as conchas univalves. As campanas de lapas, semelhantes a barracas microscópicas,
aderiam ao rochedo e grupavam-se em aldeias em cujas ruas rolavam as
multivalves, esses escarabeus da vaga. Não podendo os seixos de mariscos entrar
facilmente nessa grota, aí se refugiavam as conchas. As conchas são grandes
fidalgos que, bordados e paramentados, evitam o rude e incivil contato do
populacho das pedras. A fúlgida reunião das conchas fazia debaixo da água, em
certos lugares, inefáveis irradiações através das quais entrevia-se um grupo de
azuis e vermelhos, e todos os reflexos da água.
Na parede da caverna, um pouco
acima da linha de flutuação da maré, uma planta magnífica e singular prendia-se
como um debrum à tapeçaria do sargaço, continuava-o e terminava-o. Essa planta,
fibrosa, vasta, inextrincavelmente dobrada, e quase negra, oferecia ao olhar
largas toalhas embaraçadas e obscuras, ornadas em toda a extensão de numerosas
florinhas cor de lápis-lazúli. Na água parecia que essas flores acendiam-se, e
cuidava-se ver brasas azuis. Fora da água eram flores, dentro da água eram
safiras, de modo que a onda, subindo e inundando o esvazamento da grota,
revestia essas plantas e cobria o rochedo de carbúnculos.
A cada enchimento da vaga túmida
como um pulmão, essas flores banhadas resplandeciam, a cada abaixamento
apagavam-se; melancólica semelhança com o destino. Era a aspiração, que é a
vida; era a expiração, que é a morte.
(HUGO, Victor. Os Trabalhadores
do Mar. Trad. Machado de Assis. São Paulo: Nova Cultural, 2002, p. 220-221)