terça-feira, 30 de agosto de 2011

As aventuras de Huckleberry Finn

Um amigo jornalista, a quem admiro muitíssimo, perguntou-me outro dia se eu já lera Mark Twain, As aventuras de Huckleberry Finn (1885). Eu fiquei desconcertado. Sempre fico quando falam em um clássico que eu ainda não li...rsrsrs
A verdade é que teríamos que viver, no mínimo, duzentos anos para conhecer todos os que desejamos, aqueles que de verdade vale a pena conhecer, no universo da literatura. Estou concluindo isso, porque quanto mais vivo, e vivo lendo, mais vejo que ainda falta tanto para eu conhecer!
Que maravilha essa infinitude que a literatura representa, não apenas em quantidade, mas na qualidade de cada um desses livros incríveis. No aprendizado que nos proporcionam, na sabedoria que encerram!
Então, fui até a livraria cultura e comprei meu exemplar da coleção de bolso da L&PM. Que livro bem traduzido! A isso devemos agradecer Rosaura Eichenberg. O livro é dificílimo de se traduzir, porque o autor registrou toda a linguagem muito comum na sua época entre os negros e as crianças do extrato social a que pertence Huckleberry Finn.
O garoto que dá nome ao livro é sensacional. É uma espécie de "Pedrinho" (o personagem de Monteiro Lobato) norte-americano, com a diferença que esse é uma criança literalmente sem teto e que vive a maior parte da história descendo de jangada o rio Mississippi, na companhia de um escravo negro fugitivo, seu grande amigo, entre outros personagens que vão conhecendo nesse caminho nebuloso.
Hoje, quando eu lia o livro, durante o trajeto de volta para casa, e que, aliás, estou quase terminando, por um momento, eu levantei o rosto para olhar o entorno, os demais passageiros do trem, e eu sorria. Sentia todos os músculos do meu rosto relaxados. Esse é um livro para se ler, assim, embevecido. Ele nos provoca isso mesmo. Nele, ouvimos uma criança dizendo do mundo e o que ela vê pode ser triste, por vezes, na maior parte da história o é, mas essa visão é abençoada por toda uma fantasia que a protege, que a alivia dessa mesma dureza do mundo.
O trecho que me provocou a alegria incontida, foi já perto do fim da história, quando tendo encontrado Tow Sawyer, um outro garoto da mesma idade (seu amigo e personagem do livro anterior do autor As aventuras de Tom Sawyer [1876]), ambos estão buscando juntos libertarem Jim, o negro que fora capturado, eles estão tramando um plano para essa nova aventura. Tom Sawyer tenta convencer Finn que não devem aproveitar as facilidades, e que de fato existem para libertação de Jim, mas devem fazer como nas grandes aventuras, onde os prisioneiros cavam poços com facas, uma coisa que, no contexto em que estão, é absolutamente desnecessária! rsrsrs
Então, resolvem que podem parar de cavar com as facas e passam a usar as picaretas à disposição, fingindo que cavam com as facas, e vejam que meigo Sawyer é, ao concordar com isso, bem como Finn, o personagem narrador, ao compreender as atitudes do amigo:

-Bem - diz ele -, dá pra desculpar as picaretas e o fingimento num caso como este. Se não desse, eu não ia aprovar, nem ia ficar olhando as regras sendo quebradas... porque certo é certo, e errado é errado, e não tem essa de alguém fazer uma coisa errada quando ele não é ignorante e sabe das coisas. Dava pra ocê cavar com uma picareta para soltar Jim, sem fingir, porque ocê não sabia das regras, mas não dava pra mim, porque eu conheço essas coisas. Me dá uma faca de mesa.
Ele tava com a sua, mas eu entregue a minha pra ele. Ele atirou a faca no chão e disse:
- Me dá uma faca de mesa.
Não sabia o que fazer - mas aí pense. Andei por ali, entre as velhas ferramentas, peguei uma picareta e entreguei pra ele, e ele pegou a ferramente e começou a trabalhar, sem dizer palavra.
Ele foi sempre desse jeito. Cheio de princípios.

4 comentários:

  1. Quando li Tom Sawyer, pouco depois comprei uma versão em Inglês de Huckleberry Finn. Não li ainda... Bem, já disse isso no Facebook :p ... Agora essa capa no final do texto, não gostei. Destruiu a imagem que eu tinha do Huck, pois o imaginava meio ruivo, com sardas e meio gostinho. Muito estereotipado, não? Legal que está gostando do livro. Sabe um que você deveria ler? Trabalhadores do Mar do Victor Hugo. Lembro quando li esse livro, fiquei triste por ter acabado.

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  2. Josafá, eu não preciso ler nenhum livro, para sentir os meus músculos relaxados. Lendo o seu Blog como leitora que sou, fico extasiada com a maneira e riqueza dos seus comentários: Seja sobre uma obra de um livro, seja comentário de um filme, seja de uma gravura, de uma peça de teatro, te acho espetacular. Aí sim , eu fico completamente relaxada. Parabéns, Josafá pelo seu riquíssimo "BLOG". Continue expressando sua inteligência. Te admiro muito.!!!.

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  3. Josafá! Adoro suas publicações, seus textos são sempre muito interessantes e as dicas ótimas! Esse livro eu não li ainda, mas me interessei bastante, depois de te ler! Admiro seu trabalho!

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  4. Luis,
    Eu escolhi a capa da versão em inglês justamente porque eu imaginava o Finn exatamente assim! rsrsrs Mas a sua versão do garotinho ruivo é muito boa também, seria mais sapeca né? kkk Obrigado pela dica do Victor Hugo, dele eu só li Os Miseráveis e o O Corcunda de Notre Dame... Vou atrás desses trabalhadores.

    Já minhas amigas Anônima e Catarina, meninas!, o que posso dizer depois de ler esses comentários tão generosos? Só vou dizer que fiquei emocionado!;-D Merci

    beijos a todos!

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