Quando eu tinha 16 anos, eu lia muito Erich Fromm. Obviamente, por vezes, eu
achava tudo muito profundo e não tinha uma compreensão plena do que estava lendo.
Mas eu me lembro de me identificar com muito do que ele sempre disse por meio
de suas obras. Naquele tempo, eu nem sabia o que tinha sido a psicanálise para
a história e tampouco o que ela seria para mim mesmo, 15 anos mais tarde.
A verdade é que eu fiz análise durante um tempo e foi tão
bom! Por conta dessa experiência, eu me sinto muito grato a estes caras que
pensaram a psique humana, e, aliás, penso que todos nós, em sã consciência,
deveríamos nos sentir gratos.
Hoje minha vibe não é a de aceitar prontamente o discurso
psicanalítico ou ao menos um aspecto dele e que tende a promover a
desconstrução da metafísica, ou ao menos pretende desconstruir
o que assim se costuma chamar, ou seja, qualquer interpretação ou vivência transcendente da vida
humana no planeta.
Erich Fromm apresenta-nos a vantagem de ser um livre pensador
e humanista. Eu tendo a confiar muito mais neste tipo de intelectual e
cientista.
Emprestei esta semana, na Biblioteca Mário de Andrade, para matar saudades, seu livro: O dogma de Cristo e outros ensaios sobre
Religião, Psicologia e Cultura. 2ª ed., Trad. Waltensir Dutra, Rio de
Janeiro: Zahar Editores, 1965.
No ensaio intitulado “O Caráter Revolucionário”, ele chega a
conclusões deliciosas e que eu preciso compartilhar com vocês! Enjoy it!
(...) entendo como caráter
revolucionário não um conceito ético, mas um conceito dinâmico. Não se é “revolucionário”
nesse sentido caracterológico porque se pronunciem frases revolucionárias ou se
participe de uma revolução. O revolucionário, nesse sentido, é o homem que se
emancipou dos laços de sangue e solo, da mãe e do pai, das lealdades para com o
Estado, classe, raça, partido, religião. O caráter revolucionário é humanista
no sentido de que se sente parte de toda a humanidade, e nada que seja humano
lhe é estranho. Ama e respeita a vida. É um cético e um homem de fé.
É cético porque suspeita das
ideologias como disfarce de realidades indesejáveis. É um homem de fé porque
acredita no que existe potencialmente, embora ainda não tenha nascido. Pode
dizer “não” e ser desobediente precisamente porque pode dizer “sim” e obedecer
a princípios genuinamente seus. Não está semi-adormecido, mas plenamente
acordado para as realidades pessoais e sociais que o cercam. É independente, e
o que é deve aos seus esforços. É livre, e não o servo de ninguém.
Esse sumário pode sugerir que
descrevi a saúde mental e o bem-estar, e não o conceito do caráter
revolucionário. Na realidade, a descrição dada reproduz a pessoa sadia, viva,
mentalmente sã. Minha afirmação é a de que a pessoa sadia num mundo insano, o
ser humano plenamente desenvolvido num mundo aleijado, a pessoa plenamente
desperta num mundo semi-adormecido – é precisamente o caráter revolucionário.
Quando todos estiverem acordados, não haverá mais profetas ou caracteres
revolucionários – haverá apenas seres humanos plenamente desenvolvidos.
A maioria das pessoas,
naturalmente, jamais teve caráter revolucionário. Mas a razão pela qual não
vivemos mais nas cavernas é precisamente por ter havido sempre um número
suficiente de caracteres revolucionários na história romana para nos tirar das
cavernas e de seus equivalentes. Há, porém, muitos outros que pretendem ser
revolucionários quando na verdade são rebeldes, autoritários ou oportunistas políticos.
Creio que os psicólogos têm uma função importante no estudo das diferenças de
caráter entre esses vários tipos de ideólogos políticos. Mas para isso é
preciso, receio, ter algumas das qualidades que procuramos descrever aqui:
devem ter um caráter revolucionário.